Audiência pública coloca em debate o retorno presencial das escolas

Na próxima terça-feira (3), tem início o ano letivo de 2021 na rede pública municipal de ensino. Em resposta às expectativas de retorno presencial das atividades escolares em meio à pandemia de covid-19, a Câmara do Recife realizou uma audiência pública sobre o tema nesta quinta-feira (25). A iniciativa do debate, que aconteceu de forma remota, partiu da vereadora Liana Cirne (PT).

Ao dar início à audiência, a parlamentar explicou suas finalidades e argumentou que, sem a interrupção das aulas presenciais, o número de vítimas de covid-19 poderia ter sido ainda maior no Brasil. Cerca de 250 mil pessoas já morreram da doença no país. “Os objetivos desta audiência pública são realizar a escuta das entidades representativas de trabalhadores e trabalhadoras da educação, sociedade civil e governo acerca do retorno seguro das aulas presenciais na rede pública municipal de ensino”, disse. “O único isolamento efetivo no Brasil foi o promovido pelas entidades representativas dos trabalhadores na educação em todo o país. Não sabemos avaliar quais serão os impactos de deixar de fazer esse isolamento”.

Liana Cirne apresentou alguns dados e informações sobre a pandemia, a gestão da crise decorrente da covid-19 e a situação das escolas do Recife. De acordo com um levantamento feito por seu mandato em cinco unidades de ensino da rede RPAs 1, 5 e 6, e nas redes sociais, teriam sido encontrados problemas como salas, refeitórios e corredores pequenos, falta de circulação de ar e espaços de recreação, desabastecimento de água, falta de pessoal para colocar protocolos de segurança em prática. “Partimos da premissa de que é preciso o retorno presencial das aulas, mas esse retorno deve se dar com segurança”.

Diversos vereadores e vereadoras prestigiaram a audiência. Uma delas foi a vereadora Ana Lúcia (Republicanos), presidente da Comissão de Educação, Cultura, Turismo e Esportes da Câmara. “A gente precisa saber qual é o planejamento que a Secretaria de Educação tem para fazer esse retorno com segurança. Nossa rede, quanto à sua estrutura, avançou muito. Mas falta muita coisa. Não vamos conseguir fazer tudo de imediato, mas queremos continuar garantindo os direitos de estudantes e professores”.

Vice-presidente da Comissão de Educação, a vereadora Cida Pedrosa (PCdoB), comentou que a modalidade remota significou um aumento da carga de trabalho dos professores, mas o retorno representa riscos à saúde de todos. “Sabemos que urge a volta às aulas presenciais. A perda emocional das crianças é enorme. A aula à distancia e complicadíssima. A categoria quer voltar porque está trabalhando triplicado. Mas essa volta tem que ser muito bem pensada. Hoje, entramos com um projeto de lei para incluir que os professores sejam incluídos na Fase 1 da vacinação”.

O vereador Alcides Cardoso (DEM) frisou que o Governo do Estado já sinalizou cautela ao município no retorno às aulas presenciais. “Após o TCE denunciar a precariedade das escolas de Pernambuco, o governador prorrogou a volta às aulas para o dia 12 de março. Sabemos da necessidade do retorno, em especial para os alunos da periferia, que não têm como estar em casa online. A vacina é o mais importante, mas há também a questão da falta d’água, o distanciamento”.

Já o vereador Marco Aurélio Filho (PRTB) se mostrou preocupado com os efeitos de uma extensão do ensino puramente remoto. “Procurei saber como vai ser essa volta às aulas e o secretário de Educação, Fred Amâncio, afirmou que sua equipe vai cumprir todos os protocolos. Tem um parecer da Sociedade de Pediatria falando da importância da volta às aulas presenciais. Para o desenvolvimento cognitivo e emocional dos alunos, é importante o convívio em sala de aula”.

A vereadora Dani Portela (PSOL) lembrou o aumento do número de casos de infectados no país. “Precisamos olhar pela ótica dos profissionais de educação, que já são precarizados. A pandemia está crescendo, as UTIs chegando ao limite. Como vamos discutir se vamos abrir as escolas, se elas não têm condições de receber os alunos? Nossa luta é pela vacinação e pelas condições adequadas”.

Por sua vez, o vereador Ivan Moraes (PSOL) também se manifestou a favor da vacinação de trabalhadores da educação antes do retorno às atividades presenciais. “Temos visto cada vez mais escolas da rede privada ensaiando a volta às aulas, mas muitas vezes voltando atrás depois de poucos dias. Precisamos voltar, mas com segurança. Estamos vivendo o pior momento da pandemia. Nada explica a urgência em voltar a uma normalidade que ainda não é possível”.

O secretário de Educação do Recife, Fred Amâncio, explicou as medidas adotadas pela Prefeitura ao longo da pandemia  e deu detalhes sobre o planejamento do retorno às aulas – que, segundo ele, ainda não tem data certa. “Antecipo que o início das atividades será de forma remota, já que não temos a definição sobre as datas do processo de retomada das aulas presenciais na rede municipal”.

De acordo com o gestor, a expectativa é que em um primeiro momento a Prefeitura determine um sistema misto de ensino, com atividades presenciais e remotas, e uso das unidades de ensino mais bem adaptadas. “Vamos seguir a sugestão feita pelo Governo do Estado, começando pelos anos finais e depois passando para os anos iniciais, até chegar ao ensino infantil. Vamos trazer muitas novidades para o ensino híbrido, com uma série de novas atividades remotas”.

Amâncio informou que neste mês será concluído o processo de instalação de novas pias em 250 escolas. Está em processo de conclusão, afirmou o secretário, a aquisição de diversos equipamentos de segurança para as 319 unidades da rede, como termômetros, máscaras, face shields e totens de álcool em gel.

A respeito da possibilidade de adiantar a imunização dos trabalhadores do setor, o secretário explanou que “a todos que trabalham nas escolas é importante dar prioridade. Mas não podemos simplificar o processo de compra da vacina. O processo de mudança de fase [de imunização] também não é tão simples e envolve mexer com outros grupos prioritários. A discussão sobre a vacinação ser pré-requisito é mais complexa”.

A audiência contou, ainda, com a participação de representantes de uma série de entidades, além de pessoas que acompanharam o debate pela internet. Na mesa virtual do debate, esteve presente o presidente do Conselho Municipal de Educação do Recife, Francisco Luiz dos Santos, que apresentou uma nota conjunta do órgão com o Conselho Municipal de Saúde. “Esses dois conselhos se posicionaram pela não volta das escolas antes da vacinação. O Conselho de Educação também trabalha em uma resolução das aulas presenciais, que deve ser concluída ainda neste início de ano e vai contemplar alternativas que permita o desenvolvimento dos estudantes”.

O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, Heleno Araújo, falou da precarização das regras de trabalho no ensino remoto e repercutiu uma campanha promovida pela entidade. “Essa campanha tem três eixos: vacina para todas as pessoas, com prioridade para trabalhadores e trabalhadoras em educação, a volta do auxílio emergencial, para que o povo tenha condições de comprar alimentos e garantir o distanciamento social, e o ‘Fora, Bolsonaro’, que é o motivo do que passamos no país”.

A coordenadora geral do Sindicato Municipal dos Profissionais de Ensino da Rede Oficial do Recife, Claudia Ribeiro, chamou a atenção para o crescente número de casos de covid-19. “A gente tem um governo nacional negacionista. Mas, em plena pandemia, governos estaduais e municipais abriram todo tipo de atividade. Temos, em Pernambuco, o maior nível de letalidade, perdendo só para o Rio de Janeiro. Estamos em uma ascendência de contaminação, e o que explica hoje a discussão da abertura das escolas? Escolas abertas são vetores de contaminação”.

Para o diretor sindical do Sindicato dos Servidores Municipais do Recife, Clínio Oliveira, as escolas da rede pública municipal não estão preparadas para o retorno às aulas presenciais. “As escolas são um alvo de disseminação que vai trazer muito mais problemas. Fizemos um questionário e constatamos que, das 91 escolas que responderam, 76 não atendiam nem o protocolo inicial proposto pelo Governo do Estado”.

A representante do Fórum Municipal Popular de Educação do Recife, Cida Freire, disse que a escola deve privilegiar a proteção da vida. “O debate na educação infantil é como uma gangorra, não tem avanço. É uma conversa sobre manter vivo o mercado e manter a vida das pessoas. Esse debate não pode continuar dessa forma. É preciso pensar em políticas que garantam a vida com segurança, e não sobre retomar no momento em que a pandemia mais está matando”.

O debate contou, ainda, com representantes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Pernambuco, do Conselho Tutelar e do gabinete da vereadora Liana Cirne.

Em 25.02.2021, às 18h54