Exploração sexual e tráfico humano são temas de audiência pública

Na tentativa de convocar os poderes constituídos e a sociedade civil para o enfrentamento da exploração sexual e o tráfico de mulheres e crianças, a vereadora Isabella de Roldão (PDT) promoveu audiência pública na manhã desta quarta-feira, 9, na Câmara Municipal do Recife. A reunião lotou o plenarinho. “O meu principal objetivo é dialogar com o 23 de setembro, quando se comemorou o Dia Internacional contra a Exploração Sexual e o Tráfico de Mulheres e Crianças. A audiência hoje dá visibilidade a esses dois problemas, que à princípio podem parecer ficção, mas que são reais. Além de questões morais, são temas que se configuram para mim como uma violação dos direitos humanos e atos criminosos”, disse a vereadora.

Importantes dados foram apresentados pelo juiz da 1ª Vara de Execução Penal, que já trabalhou na Vara da Infância e Adolescência, Luiz Rocha. Ele analisou 500 processos  que foram julgados e arquivados nos últimos 26 anos, no Recife, sobre abuso sexual de crianças e jovens. “É preciso punir os agentes abusadores com severidade. O Tribunal de Justiça do Estado, hoje, tem boa estrutura para identificar e punir o criminoso. Mas é preciso que os processos andem”, afirmou. Na análise que ele fez dos 500, só 18% dos processos foram julgados. Através dos dados colhidos, desenhou um perfil do abusador das criança e jovens: ao contrário do que se pensa, o agente tem entre 18 e 25 anos (na maioria), 86% trabalham, 61% são solteiros, 23% são casados e 89% não têm antecedentes criminais. Além disso, 56% são pessoas sem vínculo familiar, 14% eram os pais, 91% conheciam a vítima. Entre as vítimas (incidência maior aos 4 anos e aos 13), 83% estão em fase escolar, 44% têm laços familiares e 80% são meninas.

A audiência pública foi representativa com diversos segmentos da chamada rede de assistência às vítimas de exploração sexual e prevenção de tráfico. Além do juiz, estiveram presentes três secretários municipais do Recife: a secretária da Mulher, Sílvia Cordeiro; da Juventude e Qualificação Profissional, Marília Arraes; de Segurança Urbana, Murilo Cavalcanti; a coordenadora do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, Jeanne de Aguiar; a delegada de Proteção da Criança e Adolescente, Kelly Luna; a coordenadora do Coletivo Mulher Vida, Adriana Duarte; e a representante do Movimento de Combate ao Tráfico, Fátima Lucena. Em reforço aos dados do juiz Luiz Rocha, a delegada Kelly Luna confirmou que os abusos sexuais contra crianças e jovens “são constantes e muito complexos”. Segundo ela, é um crime que depende da denúncia de terceiros, pois as vítimas são crianças que, pela própria condição, normalmente não têm como se defender ou denunciar.

A secretária da Mulher, Sílvia Cordeiro, analisou o outro tema da audiência pública. “Esse tema leva à reflexão sobre o lugar da mulher no mundo. O tráfico é um crime de esfera mundial, mas temos que refletir sobre o que podemos e devemos fazer para combatê-lo”, disse. Em seu entender, o tráfico tem três objetivos: o sexual, o de venda e retirada de órgão humano e o trabalho escravo. “No caso da questão da mulher, o viés é o da exploração sexual. Através do nosso Centro Clarice Lispector, recebemos denúncias de violência doméstica e familiar, mas também começam a chegar os casos de tráfico. Eles têm aumentado muito, sobretudo entre as mulheres jovens, negras e em situação de vulnerabilidade social”, afirmou. O secretário Murilo Cavalcanti garantiu que será feita uma campanha na rede municipal de ensino, que atingirá 96 mil alunos, explicando aos jovens as questões do tráfico. “A garotada precisa entender melhor o que é a rede de prostituição e o tráfico de pessoas. Nossa ação será uma tentativa de fortalecermos as possíveis vítimas com uma cultura cidadã e não deixá-las expostas a ofertas fáceis”, afirmou.

A coordenadora do Coletivo Mulher Vida, Adriana Duarte, disse que muitas pessoas estão indo à Europa com promessas de trabalho e esse fluxo migratório termina favorecendo o tráfico. “A pobreza, aliada às promessas de vantagens financeiras, tornam esse tráfico mais fácil. A lógica globalizada e o desejo de consumo são celeiros que propiciam essa situação”, denunciou. A coordenadora do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, Jeanne de Aguiar, por sua vez, acrescentou que um forte trabalho de prevenção vem sendo realizado no interior de Pernambuco. “É um trabalho que envolve toda a rede de assistência e prevenção, nas escolas, junto aos policiais e à sociedade civil. Trabalhamos a abordagem policial, o estímulo à denúncia, informações junto à sociedade, identificação de ramificações e ações repressivas”, disse.

 

Em 09.10.2013, às 12h52.