Procurador-geral do Ministério Público de Contas debate reforma tributária na Câmara do Recife
Sob a coordenação do vereador Carlos Muniz (PSB), a reunião contou com a presença do vereador Gilberto Alves (PRD), além do convidado. A reforma tributária já foi aprovada, mas a lei complementar que pretende aprimorar o sistema de tributação sobre o consumo, ainda precisa ser votada pelo Congresso Nacional. O Ministério Público de Contas é um dos órgãos que podem contribuir tanto para garantir o controle externo quanto para a fiscalização da implementação da reforma.
A Reforma Tributária foi dividida em dois grandes projetos de lei, sendo que o primeiro já virou lei, que é a lei número 214/2024 (Lei Geral da CBS e IBS e do Imposto Seletivo). O que está tramitando é o segundo projeto, o PL 108/2024, que é legislação complementar, com o regulamento do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços). Ele se propõe a unificar os impostos sobre consumo - principal meta da reforma tributária - que prevê, entre outras coisas, substituir tributos como ICMS, ISS, PIS e Cofins por um único imposto, chamado de Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) no âmbito federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de caráter estadual e municipal.
Ricos e pobres - O procurador-geral do MCP em Pernambuco, Ricardo Alexandre, analisou a reforma tributaria que está em curso e disse que ela, na essência, é boa, pois vai permitir justiça tributária sobre o consumo, garantirá mais transparência e segurança para o contribuinte, e também permitirá a devolução de uma parte do imposto sobre o consumo para a população mais pobre. Mas, segundo ele, as mudanças também têm pontos negativos como a perda de autonomia dos entes federativos, com a possibilidade de perda de receita para os municípios menores.
“Esta reforma será predominantemente sobre o consumo. Atualmente, há injustiças tributárias sobre o consumo, pois os impostos sobre consumo vão direto na garganta do povo. Na grande parte dos países a tributação sobre o consumo é mais leve do que no Brasil”, observou. Ricardo Alexandre adiantou que, com a reforma, acabará no Brasil o princípio da seletividade na tributação sobre o consumo e explicou: “A tributação sobre o consumo atinge a todos, ricos e pobres. Hoje, existe no Brasil a regra de alíquotas de impostos (IPI e ICMS) mais pesadas sobre produtos supérfluos e mais leve para os essenciais, como forma de diminuir um pouco a injustiça de tributação de consumo. Mas isso é feito de maneira capenga. A pessoa rica, por exemplo, também compra os mesmos produtos da cesta básica que se destinam à população pobre”.
Em vez do princípio da seletividade na tributação sobre o consumo, segundo Ricardo Alexandre, haverá um cashback do imposto sobre o consumo para beneficiar e fazer justiça tributária às famílias mais pobres. O tributarista acredita que esta forma será mais funcional do que simplesmente reduzir a alíquota para os produtos essenciais.
Perdas e ganhos - Ricardo Alexandre falou ainda que além dessa mudança na tributação do consumo, a reforma tributária também ocorre num momento em que há uma tendência de “servicificação”. Explicou que, atualmente, muitos produtos estão virando serviço, sobretudo quando vendidos eletronicamente. Isso termina retirando-se do imposto estadual (ICMS) e beneficiando o municipal (ISS). “Passamos por um processo em que tudo vira serviço; é um processo de servicificação. E isso tende a aumentar a receita municipal, afinal tudo o que não for mercadoria é serviço. Mas, a reforma criará um fundo para recolher de estados e municípios. O que se arrecadar vai entrar num bolo que será dividido com todos”.
Nesse processo, alguns municípios vão sair ganhando, mas outros perderão, segundo o tributarista. “Haverá uma perda de autonomia do ente federativo em relação ao imposto municipal. Os entes menores perderão ainda mais com a reforma. E esse é um dos lados ruins”. Com essa perda dos entes federativos, o tributarista observou que os vereadores, que atualmente podem legislar sobre os tributos municipais, só poderão decidir sobre a alíquota (do imposto a ser cobrado no município). “E nesse ponto é preciso ponderar com muita atenção. Essa alíquota será essencial porque ela é quem vai trazer a principal fonte de arrecadação e garantir a pouca autonomia que resta”.
Essas mudanças, porém, não serão feitas de imediato, quando a reforma tributária entrar em vigor, em janeiro de 2026. “Uma transição será feita para evitar grandes perdas”, disse. Essa transição, que durará 50 anos funcionará de 2029 e 2077. “A partir de 2029, cada município receberá duas parcelas de Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). A primeira parcela atenderá ao critério da população do município. Municípios mais populosos ganharão mais”.
A segunda parcela será paga de acordo com a regra do destino. Ela será proporcional à arrecadação que os entes federativos tinham até o dia 31 de dezembro de 2026. “Muitos municípios já estão em estado de guerra para aumentar a arrecadação até 2026. O valor será o referencial para a arrecadação futura. Ou seja, é preciso ter dinheiro em caixa, para entrar na conta, até 31 de dezembro de 2026. Por isso, os municípios precisam fazer algo para gerar arrecadação, dar chance de regularização para os contribuintes cumprirem suas obrigações, precisam usar a tecnologia, negociar para receber”, disse Ricardo Alexandre.
Ele deu um conselho aos estados e municípios: “Acredito que as secretarias de Finanças e da Fazenda precisam pensar em aumentar arrecadação neste momento, agir com inteligência fiscal para verificar e separar os casos dos tributos que os contribuintes ainda não pagaram. É preciso negociar, agir com clareza e de forma previsível, num relacionamento que gere confiança dos dois lados. Só assim aumenta a receita”.
Ricardo Alexandre firmou que através da reforma tributária também desaparecerá a manobra da guerra fiscal, que é uma maneira de estados e municípios atraírem para si os grandes empreendimentos. Os entes federativos não terão como oferecer benefícios fiscais, uma vez que todos os impostos serão recolhidos para um fundo nacional.
Clique aqui e assista a reunião da Comissão de Legislação e Justiça sobre reforma tributária.
Em 18.06.2025.