Audiência debate programa de combate a crimes sexuais no transporte público

Desde o ano passado, o Recife possui um Programa de Combate aos Crimes Contra a Dignidade Sexual no Transporte Público. A lei municipal nº 18.523/2018 – de autoria do vereador Hélio Guabiraba (PRTB) – prevê objetivos e obrigações a serem cumpridos pelo Poder Público e pelas empresas que operam no setor. Nesta quinta-feira (23), a Câmara do Recife realizou, por iniciativa do parlamentar, uma audiência pública para discutir a aplicação do programa.

A iniciativa de Hélio Guabiraba veio na esteira da lei federal nº 13.718/2018, que tipificou o crime de importunação sexual. A nova regra caracteriza atitudes percebidas como graves, mas que não podiam ser caracterizadas como estupro, por exemplo – anteriormente, acabavam sendo enquadradas como meras contravenções.

Para o vereador, é importante garantir que o Programa seja cumprido pelas instituições. “Queremos fazer uma avaliação e saber até onde podemos dizer qual a preparação que existe, se a Prefeitura e os ônibus estão cumprindo o seu papel. A fiscalização, além de ser feita pelo gabinete do vereador, esperamos que a Prefeitura realize disponibilizando uma secretaria para fazer isso permanentemente”, considerou.

O gerente de relacionamentos do Grande Recife Consórcio de Transporte, Marcus Petrônio, falou sobre as ações da entidade para preparar funcionários e conscientizar a população sobre os crimes contra a dignidade sexual. Ele abordou, ainda, os recursos do sistema de transporte para a identificação de criminosos. “Todos os ônibus da Região Metropolitana geridos pelo Grande Recife possuem quatro câmeras com capacidade de reter imagens por dois dias. Além disso, todas as pessoas que rodam catraca usando vale-transporte, vale-estudantil ou VEM Comum podem ser identificadas por ela.”

O representante do Sindicato dos Permissionários do Transporte Público Complementar de Pernambuco (SINPETRACOPE), Eduardo Fayer, disse que o sistema de fiscalização dos ônibus complementares já está a postos para colocar em prática o programa idealizado pelo vereador Hélio Guabiraba.  “Somos um sistema de microônibus que transporta 80 mil pessoas por dia. Investimos em uma sala de monitoramento para coibir roubos e furtos. A partir dessa lei, nosso corpo jurídico indicou o uso dessa sala que visualiza em tempo real o que está acontecendo nos veículos.”

A assistente social Tatiane Melo, que representou a Secretaria da Mulher do Recife na audiência, destacou os esforços de conscientização realizados pelo órgão. Ela disse que a pasta está à disposição para dar suporte à capacitação dos profissionais de transporte. “A lei do Programa tem uma importância para além da perspectiva punitivista. Para a gente, é interessante não só discutir a punição, mas o enfrentamento. Esse tipo de assédio é um reflexo de uma sociedade patriarcal, em que a coletividade das mulheres saem em desvantagem à coletividade dos homens. Os números mostram que as mulheres não têm espaço na cidade.”

A guarda municipal Janaína Albuquerque, representante da Brigada Maria da Penha, também participou do debate. “No que tange à nossa competência será de extrema satisfação contribuir no combate aos crimes contra a dignidade sexual no transporte público. Fazemos a fiscalização das medidas protetivas de urgência, ouvimos relatos e é muito doloroso ouvir de uma mulher dizer que foi espancada, estuprada.”

A delegada titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), Bruna Falcão, recuperou o clamor popular que levou à criação do crime de importunação sexual. “A problemática que existia era: a mulher que sofria essa violência em um transporte público, se a conduta fosse colocada como contravenção penal, o agente assinava um termo e era liberado. Se fosse colocada como estupro, estaríamos banalizando um tipo penal.”

De acordo com ela, em 2019 foram registrados 17 ocorrências de importunação sexual na Delegacia da Mulher do Recife. Nas outras dez delegacias desse tipo do Estado, foram 13 ocorrências. As demais delegacias de circunscrição da capital foram registrados outros dez boletins relativos a casos de importunação sexual.

A delegada Ana Elisa Sobreira, que representou a Secretaria de Defesa Social de Pernambuco na ocasião, também apontou os avanços representados pela tipificação do crime de importunação sexual. Além disso, ela apontou que os índices de registro ainda refletem uma necessidade de conscientizar a população e proteger quem denuncia. “Existia uma lacuna: nem tanto estupro, nem contravenção. Estou muito satisfeita com essa iniciativa da legislação municipal, porque a maioria desses casos ocorre nos transportes públicos. Como assessora do Departamento da Mulher, nos deparamos com um número muito baixo de registros e sabemos que ele é real. Espero que as mulheres se encorajem mais para registrar os boletins. Não é fácil, mas se mostrarmos que há um respaldo, mais mulheres vão denunciar.”

Também participou da mesa da audiência o chefe da Divisão de Fiscalização da Autarquia de Trânsito e Transporte Urbano do Recife (CTTU), Rinaldo Silva. Além dele, compareceram os vereadores Amaro Cipriano Maguari (PSB) e Ivan Moraes (PSOL). Ao fim da audiência, o público presente pôde fazer comentários e questionamentos às autoridades.

Em 23.05.2019, às 17h34