Audiência debate reforma da previdência social

As implicações da Proposta de Emenda à Constituição nº 287 – que trata da reforma da previdência social brasileira – foi alvo de uma audiência pública na Câmara do Recife nesta sexta-feira (16). A discussão, feita por iniciativa do vereador Luiz Eustáquio (PSB), levou especialistas no assunto ao plenarinho da Casa de José Mariano e ouviu representantes de diversas entidades sindicais.

Ao dar início ao evento, Luiz Eustáquio destacou o impacto que a proposta pode ter e fez um apelo à mobilização dos trabalhadores. “Essa reforma vem no intuito de destruir os ganhos e lutas dos trabalhadores. Ela serve ao capital, e não ao povo brasileiro. É uma reforma muito dura. Nós precisamos organizar a sociedade. Há uma necessidade da união e de unidade para reagir a um ataque tão brutal. Este é um momento muito sério e não podemos de forma alguma vacilar. Toda vez que existe uma situação drástica na sociedade, os que comandam o capital aproveitam para se salvar e tirar mais ainda do povo. Eles e a mídia convencem que tem que se dar mais, mas quem tem que dar mais é o povo e não quem comanda o capital. Temos um presidente que não tem nenhum compromisso com o trabalhador, com a trabalhadora.”

Caso seja aprovada, a reforma da previdência proposta pelo governo do presidente Michel Temer pode alterar diversos artigos da Constituição Federal e estabelecer novos critérios para a aposentadoria. Dentre os itens que mais receberam atenção na audiência estão a elevação do tempo mínimo de contribuição de 15 para 25 anos – a integralidade do benefício só será concedida para quem contribuir por 49 anos – e o estabelecimento da idade mínima para requerer a aposentadoria em 65 anos, modificáveis caso a expectativa de vida da população aumente. Poderão se aposentar pelas regras atuais os homens com idade a partir dos 50 anos e as mulheres com idade a partir dos 45 anos, desde que contribuam 50% a mais sobre o tempo restante até a aposentadoria.

Para explicar os detalhes da reforma da previdência ao público que lotava o plenarinho da Câmara, foram convidados dois palestrantes: o advogado Cláudio Ferreira e o vice-presidente de política de classe da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP), Floriano Martins de Sá Neto.

Segundo Cláudio Ferreira, o Brasil não está fazendo o debate que permite medir se o sistema previdenciário realmente apresenta problemas e quais seriam as medidas exatas para corrigi-lo. “Por conta da crise de 2008, diversos países da Europa tiveram que fazer reforma em suas previdências. Em todos esses países, o debate sobre quais seriam as novas regras seriam precedidos da definição se o sistema era viável ou não no curto, médio e longo prazo. Aqui no Brasil, não. É uma questão de fé: não é viável e pronto, mesmo havendo setores que dizem que ele é. Temos que fazer esse debate para mensurar se há ou não há viabilidade e qual o tamanho do rombo projetado. A partir daí e que você definiria as regras que norteariam a reforma da previdência.”

Floriano Martins apresentou a palestra ‘A Falácia do Déficit na Previdência Social’. De acordo com ele, não existe rombo na previdência quando ela é vista no contexto da chamada seguridade social, que abarca também os setores de assistência social e saúde. “O que os auditores fiscais vêm demonstrando desde o início dos anos 90 é que há uma deturpação do famoso déficit da previdência social. Os governos pegam uma única fonte de arrecadação, que é a folha de salário que é descontada do INSS, e comparam com o gasto de benefícios previdenciários. Já nós fazemos a leitura pelo orçamento da seguridade social, que é o que está na Constituição Federal. Lá é muito claro: as contribuições são outras. Além da folha, temos a COFINS e a Contribuição Social Sobre o Lucro. E quando a gente soma tudo isso e coteja com a saúde e assistência social, a seguridade social é amplamente superavitária.”

Martins ainda apontou a vinculação da previdência à ideia de que ela é deficitária como uma estratégia dos governos para garantir acesso à receita da seguridade social. “Quando há um momento de falta de arrecadação do orçamento fiscal, os governos tentam se socorrer do orçamento da seguridade social. O ‘defeito’ dela é esse: é um orçamento grande, que em 2015 foi de 700 bilhões de reais. Para legitimar esses desvios, é preciso falar mal da previdência para reduzir os direitos e as despesas e, assim, sobrar dinheiro para outras coisas. O desvio é legalizado, por exemplo, através da Desvinculação das Receitas da União e do próprio orçamento quando ele é aprovado.”

O presidente da Central Única dos Trabalhadores em Pernambuco, Carlos Veras, compôs a mesa da audiência e fez uma defesa dos direitos constituídos. “O golpe em curso é estrutural. Eles querem acabar com os direitos dos trabalhadores que estão na Constituição e na CLT. Eles querem reduzir o papel do Estado com a privatização da previdência e dos bancos públicos. Não é uma disputa eleitoral. Precisamos chamar todos contra a reforma. Direito não se negocia, direito se amplia. A posição da Central Única dos Trabalhadores é essa.”

Representando a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Pernambuco, Paulo Roberto Rodrigues disse que a reforma da previdência vai afetar negativamente os trabalhadores rurais. “Essa proposta vem para retirar direitos. Ela exclui os trabalhadores do campo e desconhece sua importância. É o trabalhador do campo quem coloca mais de 70% dos alimentos que os brasileiros consomem de manhã, ao meio-dia e à noite. Não somos o rombo dessa previdência.”

Diversos participantes da audiência defenderam a união das entidades e trabalhadores. Foi o caso do representante da União Geral dos Trabalhadores de Pernambuco, Luiz Nelson. “A UGT está unida e engajada para marchamos na defesa incansável dos nossos direitos. Não vamos permitir que nossos direitos sejam assaltados.” O representante da Força Sindical em Pernambuco, Antônio Ricardo, também salientou a importância da união. “O momento nunca foi tão oportuno para que as centrais sindicais pudessem estar cada vez mais unidas e conscientes de que não podemos aceitar de maneira alguma isso o que o governo está querendo impor. Sabemos que a previdência é lucrativa.”

Já o representante da Federação dos Aposentados de Pernambuco, José Gilberto, se mostrou preocupado com o risco de retrocesso que a PEC pode apresentar. “Na minha juventude, quando comecei a trabalhar, era uma esperança do povo brasileiro se aposentar.Estou vendo hoje esse povo que está destruindo essa esperança. Na minha juventude, eu vi mutias cenas dolorosas de pais e mães de família não poderem ir a um hospital. Vai voltar a loucura, a fome, a violência vai aumentar. Isso é doloroso.”

Em 16.12.2016, às 14h15

registrado em: luiz eustaquio