Audiência pública debate violência contra a mulher

Os números assustam e impressionam: em Pernambuco, 90 mulheres foram assassinadas de janeiro a abril deste ano, sendo 21 vítimas de feminicídio (perseguição e morte intencional de mulheres), de acordo com a Secretaria de Defesa Social (SDS). O Estado viveu, ainda, o segundo janeiro mais violento dos últimos 10 anos. A média é de 14,4 pessoas assassinadas por dia. Metade dos homicídios se concentra em 10 municípios, e sete deles estão no Grande Recife, sendo os principais Recife, Jaboatão e Olinda. Com a apresentação desses números, através de um vídeo, a vereadora Aline Mariano (PP), presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, deu início à audiência pública que debateu o tema: “Violência contra a Mulher”, na manhã desta quinta-feira (7).

As estatísticas dos primeiros quatro meses deste ano, de acordo com a vereadora, apenas repetem uma tendência macabra em Pernambuco. No ano de 2017, segundo Aline Mariano, que apresentou os dados da SDS, foram registrados 240 casos de assassinatos de mulheres. Desses, 76 foram caracterizados como feminicídios. Em 2016, foram 169 assassinatos no total, dos quais 111 tiveram como agravante o crime de gênero. “Em 2015, Pernambuco ainda não tipificava os feminicídios e, por isso, não houve registros do crime, apesar de 245 mulheres terem morrido violentamente no Estado naquele ano. O dado alarmante reflete a realidade do Brasil, País com a quinta maior taxa de homicídios de mulheres do mundo, e nos mostra que precisamos unir forças para enfrentar o problema”, afirmou.

A audiência pública, conforme explicou a parlamentar, teve como finalidade “discutir a situação e apontar caminhos que possam ajudar neste enfrentamento à violência de gênero. Como vereadora, tenho estado atenta a essa lamentável situação. Atualmente, sou presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, um espaço importante, onde podemos tratar pautas relacionadas a gênero, feminicídio, violência, entre outros temas de interesse”, afirmou. A comissão faz uma ponte com o Executivo e com a Secretaria da Mulher do Recife, no sentido de assegurar as políticas que são prioritárias para a mulher.

“Entendemos que é preciso abrir cada vez mais espaços como esse para as mulheres, para que possamos contribuir para melhorias relacionadas com ações efetivas que envolvam todas as mulheres, em todos os ciclos de vida e nos diversos grupos populacionais, sem discriminação de qualquer espécie”, disse. Aline Mariano é autora de duas leis que beneficiam as mulheres vítimas de violência doméstica e familiar no Recife. São elas: a 18.318/17, que dispõe sobre a criação do Banco de Empregos para as Mulheres Vítimas de Violência Doméstica e Familiar no Recife, sancionada pelo prefeito Geraldo Julio em junho do ano passado; e a 18.428/17, que trata sobre a prioridade de vaga e transferência em creche para criança filha ou filho de mulher vítima de violência doméstica, de natureza física ou sexual no Recife.

Também está em tramitação na Câmara Municipal outro projeto de sua autoria, o de número 108/2017, que pede a isenção da tarifa de transporte coletivo público urbano do Recife para as mulheres vítimas de violência doméstica e familiar que tenham boletim de ocorrência registrado na Delegacia da Mulher, até o deferimento da medida protetiva. “Temos outros mecanismos importantes que hoje dão proteção à mulher, como o decreto que substitui a nomenclatura "crime passional" e institui o termo "feminicídio" nos boletins de ocorrência que se referem a registros de homicídios contra mulheres”, disse. O de Pernambuco foi assinado em setembro de 2017, pelo governador Paulo Câmara, dois anos após a criação da Lei do Feminicídio.

Fizeram parte da mesa de debates da audiência a defensora Pública do Núcleo Especializado na Defesa da Mulher, Virgínia Célia Moury Fernandes; a promotora de Justiça Criminal da Capital, Vivianne Maria Freitas Melo Monteiro de Menezes; a gerente geral de Controle Social da Secretaria de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos do Recife, Ana Maria Farias Lira; a gestora do Departamento de Polícia da Mulher, Julieta Japiassu; a delegada do Departamento de Polícia da Mulher, Gleide Ângelo; e o gestor do Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros (Cisam), onde funciona uma maternidade pública municipal, Olímpio Barbosa.

Gleide Ângelo disse que tem aumentado, nos últimos meses, o número de mulheres que denunciam os casos de violência praticados contra elas. “Sempre foi um crime subnotificado e dificilmente se saberá qual a realidade em se tratando das violências praticadas contra a mulher. Mas, eu acho que está aumentando o número de mulheres que estão indo às delegacias fazer notificações”, disse. Segundo a delegada, quando elas procuram as autoridades policiais para denunciar as agressões estão “se libertando de um ciclo de violência e não serão vítimas de feminicídio. A mulher tem que saber que o homem que ameaça ou bate, termina matando”.

 

Depois de ter atuando em numerosos casos de assassinato de mulher, Gleide Ângelo agora está realizando a Caravana da Mulher nos municípios do interior. “Vamos orientar, conversar, dar palestras. Estamos fazendo um trabalho de prevenção”, explicou. As prefeituras solicitam a presença da caravana à chefia da Polícia Civil e também fazem o chamamento das mulheres nos municípios. “Elas também oferecem o espaço e a infraestrutura. E nós damos a palestra num local que possa acolher o maior número possível de mulheres”, disse. Gleide Ângelo informou que Pernambuco dispõe de dez Delegacias da Mulher. Além disso, há dez Varas de Violência Doméstica e Familiar contra Mulher no Tribunal de Justiça de Pernambuco. Existe, também, o monitoramento da distância dos agressores das vítimas via GPS. Ela entende que somente a ação policial e da justiça não serão capazes de acabar com o crime de femicidício, pois depende também do envolvimento da sociedade e com a educação de jovens.

A defensora Pública do Núcleo Especializado na Defesa da Mulher, Virgínia Célia Moury Fernandes, afirmou que a mulher “está mais empoderada, tem mais conhecimento da lei e com isso as denúncias de agressão estão chegando nas delegacias e no Judiciário”. Ela acha que “é difícil romper o ciclo da violência”, mas que a redução do número de casos passa justamente por essa iniciativa. “Além disso, o conhecimento dos direitos, a melhoria da rede de atendimento e a educação dos jovens são determinantes para evitar que novos casos ocorram no futuro”. Viríginia Moury Fernandes disse que não existe um perfil da mulher vítima de violência. “Todas podem ser”, comentou. Baseada no atendimento que faz à população mais pobre, ela, no entanto, ela arrisca dizer que “existe um perfil mais vulnerável que é o da mulher negra, pobre e jovem”.


Em 07.06.2018, às 12h40.