Audiência pública discute saúde mental e combate ao crack
“É preciso ter um olhar diferenciado sobre o doente mental ou com transtorno mental. Qualquer pessoa em situação de estresse pode surtar. É necessário que os gestores não façam de conta que tratam o problema, mas forneçam medicamentos e, quando for preciso, tenham formas de atender estas pessoas e devolvê-las equilibradas para o seio da família”, ressaltou Vera Lopes. Ela também denunciou a maneira como os pacientes permanecem no Hospital Ulisses Pernambucano. “ Na unidade recebem um ‘sossega leão” e ficam dopados, deitados em bancos de cimento, esperando uma vaga em dois ou três hospitais que podem acolhê-los”.
No entanto a parlamentar afirmou que o que mais causa-lhe indignação é o transporte de pacientes em surto no carro de polícia. “O Samu não faz a remoção destas pessoas. Elas são conduzidas usando algemas, dentro do camburão. Como fica quem já está com alucinação e vê a polícia em sua casa? Sem falar na família”. Ela também lembrou a epidemia que está sendo o crack e afirmou que algumas pessoas podem apresentar problemas mentais por causa do uso de drogas e outras usam drogas por causa dos problemas mentais
A gerente de política municipal de Redução de Danos, Angélica Oliveira, explicou que a emergência do Ulisses Pernambucano é de competência estadual e lembrou que o fechamento de leitos psiquiátricos foi determinado por lei federal a partir da reforma psiquiátrica. “Foi verificado que em hospitais, como o Alberto Maia em Camaragibe, os pacientes apresentavam sinais de tortura física e havia casos de ficarem 30 ou 40 anos esquecidos naquele local”. A lei federal prevê a substituição destas unidade pelos Centros de Atenção Psicossocial (Caps) que dão atendimento das 8h às 17h .
Angélica Oliveira enumerou que há 17 Caps espalhados pela Região Metropolitana do Recife, além de 20 residências terapêuticas - que funcionam 24 horas, atendendo mais de 150 usuários, e quatro albergues. “ Até o final de dezembro mais três casas terapêuticas serão inauguradas no Recife “, destacou. Ela relacionou a rede de atendimento a pacientes com problemas de álcool e outras drogas, que envolve os Postos de Saúde da Família (PSF), além de uma equipe com mais de 60 agentes redutores de danos. “O crack coloca em cheque toda a forma de suporte terapêutico. Não vemos usuário pedindo ajuda, vemos a m ãe, o pai, a família”. Sobre o transporte de pacientes em surto em viaturas policiais, a gerente informou que a secretaria de Saúde do Recife promove capacitação tanto para os policiais como para os profissionais que atendem no Samu.
O coordenador municipal do Consultório de Rua, Genivaldo Francisco, explicou as ações desenvolvidas por este programa da secretaria de Saúde da cidade. “O Consultório de Rua é um equipamento clínico comunitário para fazer com que o usuário que está na comunidade, chegue até o Caps”. Segundo ele o Recife é a única capital onde o redutor de danos é um profissional concursado. “Hoje temos 60 concursados e mais 35 contratados, para atender a política ‘Recife em defesa da vida’. Esse agente conhece a comunidade em que trabalha para abordar o usuário de droga. Procuramos ajudar o usuário que precisa de atendimento e casa de acolhida, de documentação, da relação com a saúde. A problemática da droga se dá além do uso”, conclui.
O pediatra Guilherme Andrade destacou a epidemia que vem se consolidando no mundo inteiro com o crack e a ligação da droga com o crime. “ Há quem afirme que muitos detentos cometeram crimes por estarem sob o efeito da droga e, há quem diga também que as cadeias e os presídios estão repletos de doentes mentais. Se isto for verdade, sabemos que não é o local adequado para permaneceram”.
A psicóloga Edna Borba destacou que a questão da droga e saúde mental é complexa . “Cada pessoa enfrenta um conflito de forma diferente, porque os comportamentos são individuais. A droga sempre existiu. Café, cigarro e bebidas alccólicas também são drogas”. Ela citou Freud e disse que o psicanalista explicava que as questões humanas partem de três situações: lidar com a natureza, com a velhice e com o outro. “ Cada vez o ser humano está se isolando, ficando solitários e buscando meios, como as drogas para se satisfazer”.
A psicóloga enfatizou que a questão das drogas é psíquica e que algumas pessoas conseguem superar , mas a família tem uma importância fundamental na questão. “É preciso que a família e a sociedade se sintam responsáveis para combater as drogas. A fragilização da família leva muitos pais e mães a não ocuparem os papéis que deveriam ocupar”, concluiu.