Calçadas do Recife são tema de audiência na Câmara

Espaços públicos deteriorados e reduzidos, sem acessibilidade, planejamento, integração ou adequação à convivência social. As calçadas do Recife passam por diversos problemas – e eles não fogem à atenção da Câmara Municipal. Por iniciativa do vereador Jayme Asfora (PMDB), a Casa promoveu uma audiência pública na manhã desta sexta-feira (1), na sede do Poder Legislativo. O evento serviu para debater a situação dos passeios, a questão da responsabilidade sobre eles e as soluções compartilhadas que podem viabilizar melhorias necessárias.

Essa noção de compartilhamento da responsabilidade foi enfatizada por Jayme Asfora. Segundo o parlamentar, é preciso pensar a mobilidade do pedestre de forma prioritária. “As calçadas do Recife estão num estado muito degredado. E não podemos esperar uma solução para esse problema nem só do poder público, nem só do poder privado. As soluções têm que ser compartilhadas e vamos buscas encaminhamentos concretos para isso. Hoje, o espaço público é quase que totalmente aproveitado pelos carros. Não dá para ser assim: 70% da população vão trabalhar a pé ou de ônibus e metrô, e quem usa transporte público também caminha. O carro tem que andar com conforto e segurança, mas quem tem que ter mais conforto e segurança é o cidadão.”

Dentre os encaminhamentos propostos por Jayme Asfora está um requerimento que solicita ao Poder Executivo a instalação de placas de trânsito que informem sobre a preferência do pedestre nas conversões das vias. Outra proposta é a criação da Frente Parlamentar em Defesa da Mobilidade a Pé. “A mobilidade a pé inclui mais que as calçadas. Inclui o direito, que nós todos temos, de usar o espaço publico democraticamente.”

Na mesa de discussão da audiência, a diretora de projetos Rúbia Campelo representou a Autarquia de Urbanização do Recife (URB). Ela deu detalhes do projeto de requalificação de passeios públicos da Prefeitura, cujas obras tiveram início em maio deste ano. Ao total, serão empenhados cerca de R$ 105 milhões para requalificar 114 ruas e 12 largos.

De acordo com Campelo, a iniciativa concilia problemas conhecidos, como a obstrução e descontinuidade das calçadas, com diretrizes como acessibilidade, preservação histórica e arborização. “Estamos trabalhando com soluções urbanísticas que conjugam todos esses fatores. Esse é um assunto muito vinculado à vida do cidadão. A Secretaria obteve do Ministério das Cidades recursos para tratar da mobilidade a pé. Temos uma demanda reprimida na cidade como um todo. E é preciso que se compreenda que o universo temporal de uma ação como está não é de uma só gestão.”

Coordenador do movimento Olhe Pelo Recife – Cidadania a Pé, o arquiteto e urbanista Francisco Cunha ressaltou que os problemas das calçadas fazem parte de uma cultura que não enxerga o pedestre. De acordo com ele, os espaços urbanos de qualidade requerem medidas que vão além da restauração dos passeios, como a imposição de limites de velocidade para veículos motorizados. “Se juntarmos a predominância do automóvel ao preconceito, temos o profundo desrespeito ao cidadão pedestre e ao modo de deslocamento a pé. Temos um problema cultural e temos que atacar esse problema. Não basta resolver o problema da calçada. O problema é cultural. Se não o enfrentarmos, todo o esforço meritório que está sendo feito vai ser rapidamente deteriorado. Não existem cidades inteligentes sem caminhabilidade. É caminhando que as pessoas se encontram.”

A audiência pública também contou com a participação da arquiteta e professora da Universidade Católica de Pernambuco Clarissa Duarte. Uma das coordenadoras do Plano Centro Cidadão – que visa realizar estudos sobre o centro expandido continental do Recife –, ela frisou a necessidade de integrar esforços e dados urbanísticos e destacou que é preciso norteá-los por meio de rotas caminháveis. “Apenas o planejamento integrado da rua pode permitir segurança e conforto aos cidadãos. Mesmo a calçada sendo o primeiro degrau da cidadania, ela é apenas um elemento da rua e não deve ser planejado isoladamente. Não podemos planejar calçadas em retalhos. Elas têm que ter continuidade e não existe continuidade sem rotas caminháveis e acessíveis.”

A seccional pernambucana da Ordem dos Advogados do Brasil foi representada por Tatiana Vasconcelos, membro da Comissão de Mobilidade Urbana da entidade. Ela tratou, principalmente, da eficiência das campanhas educativas. “Mesmo que se trabalhe firmemente com leis excelentes, o cidadão comum não vai perceber o que tem ali. Eu me coloco à disposição para aperfeiçoamentos. Mas acredito muito que campanhas de conscientização possam ser usadas o uso desses espaços públicos que são os passeios.”

Representando o movimento Casa Forte Mais Seguro, Yves Nogueira defendeu a participação social como uma maneira de atingir mudanças na cidade. “O nosso movimento é uma iniciativa cidadã que tenta melhorar a segurança do bairro de Casa Forte e adjacências. Precisamos fazer um aculturamento. Não adianta atirar pedra na gestão pública. Eles têm muitos problemas, mas se não dermos nossa parcela de contribuição não mudamos esse cenário.”

Também discursou o presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Pernambuco, Roberto Montezuma. Para ele, é essencial pensar o problema sob a ótica do planejamento. “Quando eu planejo no geral, eu sei que o detalhe vai estar conectado no futuro. Mais importante que uma cidade com recursos, é uma cidade com ideias. Qual é a ideia do Recife para seu futuro? Uma cidade só se faz no longo prazo. Vamos ficar enxugando gelo se não quebrarmos o ciclo vicioso e voltarmos a planejar. Em 20 anos, podemos mudar uma cidade.”

Após as considerações da mesa, a audiência abriu espaço para os estudantes, arquitetos e representantes da sociedade civil e do poder público que lotaram o plenarinho da Câmara. Uma das participantes do debate foi a gerente geral da Secretaria de Mobilidade e Controle Urbano, Sondja Beirão, que falou sobre a atividade do Núcleo Técnico de Acessibilidade da pasta. “O sonho do grupo é o Plano de Acessibilidade do Recife. Ele ainda é um embrião, mas é um objetivo primordial.”

Em 01.09.2017, às 14h12