Luis de La Mora é cidadão do Recife
A reunião solene, que aconteceu no plenário da Casa de José Mariano, contou com a participação de familiares, militantes e integrantes da comunidade universitária. Em seu discurso na tribuna, Ivan Moraes falou sobre a trajetória do homenageado, que atuou não só pelo direito à moradia, mas também na esfera dos direitos às crianças e aos adolescentes. “Falamos muito sobre o direito à habitação. Mas, olhando para o seu currículo, vemos que não houve luta por direito humano aqui na cidade do Recife que não tenha contado com a participação do professor. Tenho a maior honra de conceder hoje o título de cidadão do Recife a alguém que já é cidadão da nossa cidade há mais de 40 anos.”
Ivan Mores também traçou um panorama dos problemas habitacionais do Recife e criticou a condução da Prefeitura na definição dos prazos do cronograma de revisão do Plano Diretor. “Mais da metade do Recife hoje é informal. Mais da metade da nossa cidade precisa se tornar ZEIS. São mais de 400 comunidades na fila. Essa população não pode se dizer cidadã porque não tem direitos de cidadania garantidos. Não se pode fazer as coisas de forma açodada, impedindo a participação. Estamos juntos com o PREZEIS. Tenho certeza de que todas as pessoas que estão aqui são contra debater uma cidade inteira em apenas quatro meses. Não podemos deixar que isso aconteça.”
Também ocupou a tribuna o monge beneditino Marcelo Barros. Ele falou sobre a importância das lutas pela dignidade humana. “Esta Câmara e nós, que estamos aqui, temos com ele o compromisso de fazer com que este título seja não apenas dado como se o Recife fosse um gueto, mas como se o Recife fosse um espaço de todos os habitantes da Terra. Assim, fica garantido que todo ser humano é irmão e irmã, e temos que viver num mundo em que ninguém é estrangeiro, migrante, refugiado.”
A professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Danielle Rocha destacou o impacto do trabalho de Luis de La Mora na academia. “Todos os professores do departamento de Arquitetura e Urbanismo e do Mestrado em Desenvolvimento Urbano sentem orgulho do professor Luis de La Mora. Muitos de nós fomos alunos dele. Aprendemos que ao papel da universidade não é só o ensino, mas também a extensão e a pesquisa. A extensão é o serviço da universidade para uma sociedade melhor, mais justa. Em todos os espaços, brigamos para que os movimentos sociedade tenham voz e direitos garantidos.”
O coordenador do PREZEIS Edvaldo Pereira compartilhou com o plenário seus agradecimentos ao apoio do professor. “Nós, que fazemos os movimentos sociais, temos muito a agradecer. Ele é incansável; nos liga às duas, às três horas da manhã para discutir esta cidade. Ele está nessa batalha com os professores. A universidade é grande, mas é limitada. Trabalhar para pobre é difícil, é um desafio. Temos que agradecer quando há pessoas como ele.”
Ao tomar a palavra, Luis de La Mora falou sobre o medo da ditadura no Brasil, dos receios iniciais pela vida no Recife, da integração à cidade por meio do trabalho no Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Urbano (MDU) da UFPE e nos movimentos sociais. O professor atribuiu o desordenamento urbano do Recife à desigualdade e aos interesses do mercado imobiliário – mas saudou a vocação da cidade para a não conformação. “Todos vocês que estão aqui merecem a homenagem que me foi dada. Lutar a favor do direito à cidade exige que você trabalhe com os outros. Ninguém defende a cidade sozinho. Eu não teria feito nada se o MDU não tivesse me acolhido. Sempre fui um rebelde, nunca aguentei o autoritarismo. Esta homenagem à minha pessoa não tem o menor sentido se eu não tivesse trabalhado com as coisas que existem nesta sociedade em transformação, como o PREZEIS. Eu me identifico muito com o Recife porque o Recife é uma cidade rebelde.”
Biografia – Antes de vir ao Brasil, Luis de La Mora estudou arquitetura, filosofia e sociologia no México e na Europa, onde participou ativamente dos levantes sociais do fim década de 1960. Veio ao Brasil para acompanhar a esposa, que precisava retornar ao país para cumprir obrigações de uma bolsa de estudos. Aqui, o professor integrou-se à UFPE, que desenvolvia uma pós-graduação em Desenvolvimento Urbano. Também se associou, a convite de então arcebispo Dom Hélder Câmara, ao Instituto de Teologia do Recife, onde conheceu militantes de bairro que resistiam a processos de expulsão.
Na década de 1980, esse contexto o levou a atuar na assistência a lideranças de ZEIS e à Assembleia de Bairros, além da participação no Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano. Em 1987, foi diretor da Secretaria de Habitação de Pernambuco. Atualmente, é o representante do MDU no Fórum PREZEIS, que luta pela criação de novas zonas especiais. Na UFPE, além de coordenar projetos de extensão, ensina e orienta trabalhos de pós-graduação sobre o tema da exclusão urbana – durante sua vida acadêmica, já orientou mais de 200 dissertações.
Em 15.06.2018, às 17h55