Reunião pública aborda políticas públicas à pessoa com deficiência e doença rara

A Lei Federal nº 13.146/2015 instituiu a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência. E cerca de 13 milhões de pessoas possuem doenças raras no Brasil, onde 539 mil indivíduos estão em Pernambuco, sendo em sua maioria crianças. Os assuntos foram abordados na manhã desta terça-feira (3), por meio de uma reunião pública promovida pela vereadora Michele Collins (PP), cujo tema foi debater as políticas públicas e outras iniciativas destinadas à pessoa com deficiência e doença rara. Justamente no Dia Internacional da Pessoa com Deficiência (3 de dezembro), o plenarinho ficou tomado por associações, mães e crianças com deficiência e doenças raras.

Apesar de alguns avanços, segundo Michele Collins, a exemplo da Lei Municipal nº 18.409 que dispõe sobre a implantação de um Serviço de Referência de Doenças Raras no Recife, pais e mães ainda sofrem porque não têm o diagnóstico e, quando encontram, não conseguem tratamento especializado com o acolhimento adequado.  “A Casa José Mariano será um importante espaço para se discutir as iniciativas em prol desta importante parcela da população, especialmente quanto garantia do exercício da cidadania, a exemplo dos direitos civis, políticos, sociais e econômicos”, destacou a parlamentar.

Michele Collins também frisou a Lei 18.256 de 2016, de sua autoria, que dá acesso ao auxílio-moradia emergencial a pessoas com deficiência, independentemente de sua renda familiar e pessoal, além de destacar avanços quando o PPA foi aprovado recentemente. “Este ano, conseguimos importantes avanços na área da pessoa com deficiência e/ou doença rara, a exemplo da revisão do PPA, especialmente quanto à inclusão de objetivo específico que trata garantia da acessibilidade nas habitações de interesse social, na valorização de paratletas do Recife e a inclusão da pessoa com doença rara nas ações do programa de atenção à saúde, na manutenção e aprimoramento das atividades sistemáticas de esportes participativo e educacional e na adequação de unidades educacionais. Incluímos, ainda no PPA, a garantia de merenda escolar especial a alunos com restrições alimentares”.

A promotora Dalva Cabral, coordenadora do Caop Cidadania do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), elogiou as mães pela batalha diária e explicou as ações da pasta. “Solidarizo-me com todas vocês. Infelizmente 80% dos brasileiros, ou mais, não possuem plano de saúde. Esta pasta do MPPE nos felicita porque cada conquista é um divisor de águas. Visitamos 27 cidades e observamos que os cadeirantes não têm condições de transitar pelas calçadas. Preferem as ruas porque não é possível. Estou absurdamente sensível e a Coordenadoria vai catalogar os problemas detectados nos locais que visitamos e ainda visitaremos. É imprescindível judicializar as causas. O CAOP é uma ponte para todos e todas. A comunidade surda comparece muito no MPPE e esperamos tentar resolver as questões da melhor forma possível. Juntos e juntas somos mais fortes”.

Poliana Dias, da Aliança de Mães e Famílias Raras (AMAR), confessou o sofrimento vivido pelas mães de filhos com deficiência. “Quase todos os dias, levantamos uma bandeira, seja por inclusão, seja por alimentação. Ficamos muito gratas com os voluntários que estão conosco. Muitas crianças e pais chegam com fome na AMAR. É uma luta constante. Quais são os direitos que as pessoas com deficiência que estão inseridas na Constituição têm, realmente? Quem tem protegido essas crianças? O Benefício de Prestação Continuada (BPC) é uma condição desumana porque se refere à renda familiar. 79% dos pais vão embora de casa e a mulher não tem mais expectativa de viver financeiramente. O que nós podemos fazer é dar as mãos e seguirmos em frente”.

Suelen oliveira, da DONEM, da Associação de Amigos e Portadores de Doenças Neuromusculares, explicou que se trata de doenças extremamente incapacitantes. “No início pensei em desistir de batalhar, mas eu quis buscar ações não somente pelo meu filho. Temos que pensar e se ajudar de forma coletiva. Temos 286 famílias cadastradas nessa caminhada de seis anos da DONEM. Pouco avançamos, mas nós temos muito a fazer. As barreiras de preconceitos nas escolas são grandes e muitas não sabem lidar com o deficiente”. O uso do cannabidiol também foi lembrado por Suelen Oliveira. “Muitos têm discriminação, dizem que não é para fazer uso, mas é preciso ter ciência de como as pessoas têm melhorado com o cannabidiol”.

Irmã Maria da Silva Gomes, coordenadora do Instituto dos Cegos, disse que a instituição sempre busca se aperfeiçoar para atender as demandas do dia a dia.  “Nós atendemos 29 municípios de Pernambuco e muitas mães chegam três, quatro horas da manhã e as prefeituras nem sempre disponibilizam o transporte. A maioria da população é pobre e são muitas as mães sozinhas. Pela minha experiência, digo que a sociedade não dá muita atenção à inclusão e igualdade. E não precisamos de piedade, mas, sim, de oportunidade. Muitos não sabem comer, nem andar. O que eu peço é a ação dos fiscalizadores para essas leis em vigor. Inclusão só se faz com a acessibilidade”.

Tiago Dantas Saúde, conselheiro municipal e deficiente físico, disse que não saia de casa por não existir os ônibus adaptados. “Sofri um acidente de carro porque fiz uso de bebida alcoólica e hoje faço parte do Comude e trabalho no projeto Lei Seca. Todos os dias eu luto por acessibilidade. E não luto somente por mim, mas por todos”.

Coronel Israel Moura, pai de uma filha de seis anos com microcefalia, fez um depoimento pessoal e disse que não abandonou a esposa nem a família mesmo diante das dificuldades da filha. “Minha filha nasceu em 2013, é um ser vivo e é preciso que seus direitos sejam garantidos. Não temos uma democracia. Não exercemos o direito e minha filha não tem direito de ir e vir. O Brasil não é democrático. Estive em vários países e sei o que é acessibilidade. É difícil encontrar escolas que aceitam crianças com deficiências”. O coronel ressaltou que a filha está fazendo uso do cannabidiol com sucesso. “Ela completará três meses sem crise e prego o uso medicinal dos princípios ativos. Ela evoluiu".

José Martins, representante do Grande Recife, enalteceu que a empresa precisa do apoio da população para fazer denúncias em relação ao comportamento inadequado de motoristas e cobradores no atendimento ao deficiente. “Nós temos como multar a operadora que não cumprir com as determinações do processo licitatório e contamos com a fiscalização da população. Já demitimos, inclusive, motorista e cobradores que desligavam o elevador. Nossa maior dificuldade é judicializar esse tipo de comportamento e contamos com a população para fazer as reclamações.  Temos projetos de pisos táteis em andamento para dois terminais de ônibus e serão iniciados quando concluírem o processo de licitação”.

Ketyanne Barros dos Santos, professora brailista da Fundação Altino Ventura e do Centro de Apoio Pedagógico para atendimento às pessoas com deficiência visual de Pernambuco, é deficiente visual e foi à reunião pública acompanhada de um cão-guia. Ela fez um testemunho de vida confessando que ainda passa por muitas dificuldades. “Tem que torcer para que um Uber não cancele uma corrida por causa do cão. Recebemos um BPC vergonhoso e ser deficiente é caro. Tem que manter um animal limpo e bem cuidado. Não precisamos de misericórdia, mas de oportunidade, como disse a Irmã Maria. Eu pedia a Deus para que eu tivesse condições de atuar mais em defesa dos deficientes e fui convidada para participar desse evento”. Após suas palavras, Kate fez uma apresentação musical tocando violão.

Ao final da reunião pública, alguns encaminhamentos foram anunciados. Dentre eles, a criação de uma subcomissão (dentro da Comissão de Direitos Humanos); sugestões para adaptação nos trocadores nos shoppings centers e revitalização nas calçadas no IMIP e na Clínica Rarus, do Hospital Maria Lucinda.

 

Em 03.12.19 às13h15.