Vereadora debate causas e consequências do feminicídio
Ana Lúcia é autora do projeto que virou Lei Municipal número 18.351, sancionada pelo prefeito Geraldo Júlio no dia 19 de julho de 2017, que institui o mês de mobilização de todos pelo fim da violência contra as mulheres e cria a Campanha do Laço Branco. “É importante existirem as campanhas de combate à violência, pois eu acredito que elas trazem resultado, uma vez que alcança um número grande de pessoas. É preciso debater questões culturais, históricas e comportamentais que nos trouxeram a esse cenário e avaliar como cada setor da sociedade pode contribuir para que vejamos o fim do extermínio de mulheres em nosso Estado”, disse a vereadora. Autoridades, especialistas e representantes da sociedade civil participaram do debate. A mesa foi composta pela delegada de Polícia Gleide Ângelo; a advogada Maira Kerstenetzky; a representante do movimento Meu Recife, Camila Fernandes; a secretaria Executiva da Mulher, Inamara Melo; a representante do Movimento de Mulheres de Lagoa do Carro, Maria José Barbosa; e o deputado estadual Ossésio Silva.
No início da audiência, a vereadora exibiu um vídeo curto e pedagógico explicando sobre o feminicídio. De acordo com os depoimentos do filme, esse tipo de crime não é o assassinato de mulher por qualquer razão. Mas o assassinato pela sua condição de ser mulher. É um crime que começa a ser perpetrado anos ou meses antes da morte, com pequenas agressões físicas e psicológicas. Ele vem de um histórico de desprezo pelos direitos da mulher e ódio pelo feminino. “O assassinato de mulheres não deve ser apenas causa de comoção pública. A sociedade precisa se atentar aos inúmeros casos, em diversas cidades de Pernambuco, que nos mostram que estamos falhando enquanto sociedade em nosso dever de garantir o direito à vida e que existe uma série de distorções de percepção em relação às mulheres enquanto cidadãs e sujeitos de direito. Diante dessas circunstâncias, nada mais justo e válido que a mobilização social em seus vários setores”, argumentou a vereadora.
Funcionários do gabinete da vereadora Ana Lúcia vestiram preto em memória das mulheres que foram assassinadas este ano. Panfletos com o texto da lei da Campanha do Laço Branco foram distribuídos entre os participantes da audiência pública, a maioria mulheres, e familiares de mulheres vítimas de feminicídio. Maria José Barbosa foi uma delas. É tia de Mirella Araújo, morta pelo vizinho, em Boa Viagem, em abril deste ano. “É muito doloroso para nós fazermos parte de uma audiência como esta, pois é impossível esquecer Mirella. Mas, no dia da morte dela, eu jurei dedicar o resto de minha vida à luta contra o feminicídio”, disse. Para Maria José, as campanhas de prevenção têm ajudado a diminuir as ocorrências e ela também entende que Pernambuco vem avançando. “A então presidente Dilma Housseff sancionou a lei do feminicídio, mas Pernambuco foi o primeiro estado a obrigar, através de decreto, que as ocorrências policiais digam quando as mulheres são vítimas de violência pela sua condição de mulher”, observou.
Gleide Ângelo lembrou que a repressão aos crimes contra a mulher é importante, mas que a prevenção tem o mesmo peso. “Só a polícia não tem como resolver o feminicídio. É preciso um trabalho de rede, que envolva as secretarias que tratam da questão da violência, da educação, da questão da mulher; da participação das entidades da sociedade civil e das pessoas”, afirmou. Segundo ela, feminicídio é um crime anunciado. “Ele é um crime que vem de um ciclo de violência cometido pelo homem contra a mulher. Mas a mulher prefere não denunciar. As mulheres precisam confiar no trabalho da polícia”, disse. Segundo ela, dos 3.743 casos de assassinato ocorridos no Estado, de janeiro a agosto, 50 foram de feminicídio. Significa 1.33% das ocorrências. “Significa que os números estão sob controle em Pernambuco. Mas não podemos descuidar. Nossa luta é para que não morra nenhuma mulher”, disse. Ainda de acordo com a delegada, de janeiro a agosto foram feitos em Pernambuco 16.357 boletins de ocorrência de violência doméstica. Apenas uma mulher, que fez o BO, foi vítima de feminicídio. “Em geral, a mulher que denuncia, impede que o feminicídio ocorra”.
A advogada Maira Kerstenetzky, da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PE, fez uma ampla apresentação sobre gênero, identidade de gênero, posição da mulher no Código Penal de 1940, violência de gênero e crime de feminicídio. Também abordou a Lei Maria da Penha (lei número 11.340/2006) e a do Feminicídio. “Somente as leis não são suficientes para combater os diversos tipos de violência contra a mulher. É preciso haver uma mudança de pensamento da sociedade. O feminicídio pode até prender o agressor, mas não diminui a violência”, atestou. A secretaria Executiva da Mulher, Inamara Melo, afirmou que até a década de 90, 70% dos casos de violência contra a mulher aconteciam dentro de casa e tinham como agressores seus companheiros ou ex-companheiros. Esse dado se modificou e atualmente cerca de 50% dos casos de violência contra a mulher ocorrem fora de casa. Ela também disse que a desigualdade de gênero é ignorada pelas políticas públicas em todo o País, mas que a Secretaria da Mulher do Recife vem trabalhando essa questão, enfrentando a violência doméstica e sexista e realizando uma articulação intersetorial para ajudar a combater a violência através da educação.
Em 13.09.2017, às 12:51