Voto de repúdio a banco e a organizadores de exposição é debatido na Câmara

Um voto de repúdio ao banco Santander e aos organizadores da exposição ‘Queermuseu – Cartografias da diferença na arte brasileira’ foi motivo de discussão na Câmara do Recife nesta quarta-feira (13). De autoria da vereadora Michele Collins (PP), o voto argumenta ser justo que o Poder Legislativo municipal “repudie qualquer ação atentatória aos bons costumes e que venha tentar denegrir os valores cristãos.” Ao final do debate, o vereador Jayme Asfora (PMDB) pediu vistas para analisar a matéria.

O vereador Ivan Moraes (PSOL) foi o primeiro a subir à tribuna para discutir o voto de repúdio. “Eu queria apelar ao bom senso das pessoas.  A exposição tem 270 obras de 85 artistas, em que cinco ou seis causam desconforto. A exposição recebeu a visita de dois promotores da vara da infância, que saíram de lá dizendo que não havia nenhuma ilegalidade. Disseram que apenas sugeririam que alguns quadros produzidos para maiores de idade, fossem colocados em um recinto identificado para que crianças não tivessem acesso. Vivemos em um tempo em que é muito importante combater todo tipo de extremismo, especialmente o que tenta impor um modo de ver às outras pessoas. Não temos o direito de dizer que uma arte não deveria existir.”

Em um aparte, o vereador André Régis (PSDB) disse preferir não se pronunciar a favor ou contra o texto. “Não tenho informações seguras para votar esse requerimento. Eu tenho muito cuidado em aprovar repúdio. Como esta é uma Casa plural, expor uma posição dela em relação a temas polêmicos,  é algo difícil . Antecipo que, em decorrência do fato de não ter ciência de tudo o que foi exposto, me reservarei a me abster da votação.”

Já o vereador Renato Antunes (PSC) afirmou que o repúdio não é direcionado à arte ou aos artistas. “O artista tem livre manifestação. O artista faz o que deseja para o público que quer. O repúdio, pelo que entendi, é à instituição Santander. Primeiro porque ela usou recursos públicos para promover essa arte. Segundo porque essa exposição foi divulgada nas escolas municipais e estaduais. Crianças e adolescentes iriam circular naquela exposição. Não podemos concordar com isso nem com o repúdio à fé alheia. Isso não é arte, é afronta à fé alheia e aos bons costumes, quando se convida criança para assistir.”

Da tribuna da Câmara, Michele Collins pediu aos pares que votassem a favor do voto de repúdio. De posse de reproduções das imagens presentes na exposição, ela detalhou as razões que a motivaram a elaborar o voto de repúdio ao Santander. A parlamentar ainda afirmou que algumas obras estariam em desacordo com a lei. “São imagens absurdas. O povo brasileiro está chocado com essas imagens. Como é que você pega o símbolo maior da Igreja Católica, a hóstia sagrada, e escreve nela palavras de baixo calão? Isso é desrespeitar a fé das pessoas. É um abuso e infringe a legislação. Infringe o Código Penal, que estabelece pena de detenção de um mês ou um ano a quem escarnecer de alguém publicamente por motivo de crença. Fiz um levantamento de todas as leis e artigos da Constituição que são infringidos por essa exposição. A sociedade e a família vêm se deteriorando. Esta Casa precisa se posicionar.”

Respondendo à colega em um aparte, Jayme Asfora disse sentir vergonha do debate em torno do voto de repúdio. “É vergonha de termos uma cidade com tantos problemas concretos e estarmos perdendo tempo com um debate enviesado e infértil em relação a argumentos. O Santander é conhecido internacionalmente por fazer uma boa curadoria em relação a seus projetos culturais. Nessa exposição tão criticada estão expostas obras de artistas como Candido Portinari, Montez Magno, Lygia Pape. Não é possível, no século XXI, querer censurar artista. O artigo que a senhora lê do Código Penal não se aplica de forma alguma a essa hipótese. O que se aplica é a Constituição, que consagra a liberdade artística e de pensamento, e a convenção da ONU, da qual o Brasil é signatária, que manifesta a liberdade de expressão nas artes.”

O vereador Fred Ferreira (PSC), por sua vez, se mostrou solidário ao requerimento de Michele Collins. Em referência ao pronunciamento de Jayme Asfora, ele argumentou que os vereadores da Câmara têm direito a tratar de qualquer assunto que considerem importante. “Parabenizo a vereadora Michele Collins pela atitude. Um vereador não tem a autoridade para dizer o que outro tem direito de falar ou não. Cada arte tem o seu valor. Mas também me senti constrangido e acho que é um direito nosso ter essa autonomia, como vereador da cidade do Recife e representante do povo cristão.”

Em 13.09.2017, às 17h37