Comissão de Educação debate saídas para o Enem

Depois de muita polêmica e pressão nacional, o Ministério da Educação vai fazer consulta pública para adiar as provas do Enem, para dezembro, janeiro ou março de 2021, dependendo do resultado. No entanto, a discussão não é tão simples. E por isso, a Comissão de Educação da Câmara do Recife, presidida pela vereadora Ana Lúcia (Republicanos), realizou, na tarde desta quinta-feira (11), por videoconferência, audiência pública sobre os "Impactos trazidos pela Pandemia na realização do Exame Nacional do Ensino Médio". A discussão girou em torno das novas datas para o exame, sobre a desigualdade entre estudantes ricos e pobres, no que se refere a equipamentos tecnológicos e o adiamento do ano letivo. Participaram os vereadores Rodrigo Coutinho (SD), Jairo Britto (PT), Ivan Moraes (PSOL), Aline Mariano (PP), além de representantes dos Conselhos Estadual e Municipal de Educação, Ministério Público de Pernambuco, Campanha Nacional pelo Direito à Educação e movimento estudantil.

A vereadora Ana Lúcia, que também é presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Educação Pública Municipal de Qualidade na Cidade do Recife, informou que os temas do debate produzirão relatório, que será distribuído, inclusive para o Conselho Nacional de Educação, como contribuição da Câmara do Recife. Ela disse que não dá para saber como as resoluções que estão sendo elaboradas vão chegar na ponta. Acentuou as desigualdades que vêm sendo debatidas, como a falta de equipamentos de tecnologia como tablets, celulares, computadores e internet. “É muito difícil estabelecer competências em meio a esta pandemia, pois protocolos são apenas complementos para educação”.

Ela disse que é difícil estabelecer se o melhor é o adiamento do exame, para que estudantes da rede pública possam recuperar o que perderam, pois o que se vê é que a pandemia pode voltar. Sobre a desigualdade, a vereadora pontuou, que 90% dos estudantes da classe A têm computadores, enquanto nas classes C e D, apenas 40%, sendo, portanto, um exame colocado em condições desiguais.

Avanildo Duque, representante da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, acha que estamos em um contexto difícil, desafiados pelo impacto da pandemia e a falta de capacidade do Ministério da Educação em saber tratar um mecanismo que existe há 20 anos, o Enem, e que é modelo para outros países. “O Ministério simplesmente desconhece a doença  e quanto afetou à educação, sem aulas presenciais, sem contar a falta de articulação. É preciso cuidar do calendário do ensino médio, considerando as desigualdades. O ensino à distância não resolve se os alunos não têm equipamentos para acompanhar”.

Francisco Luiz dos Santos, secretário Executivo de Educação do Recife e presidente do Conselho Municipal de Educação, disse que sabe como o ensino é importante para ascensão social e que sem educação é muito difícil isso acontecer. Para ele, as oportunidades são desiguais para quem vem da rede privada e para que é da pública, com jovens que têm menos chances. “Espero que a data do exame seja flexibilizada, mas estamos discutindo ainda o retorno às aulas do ensino médio e tudo precisa estar bem conectado para minimizar o impacto nos alunos mais carentes”.

Amando Reis, representante do Conselho Estadual de Educação, pontuou que ainda não se sabe quando as escolas reabrem para aulas presenciais, mas que o Conselho vai trabalhar  com princípios e não com normatizações em função do momento. Ele disse que estão estudando parecer do Conselho Nacional de Educação sobre calendário de aulas e de atividades. Disse ainda que o documento define princípios a serem seguidos e elaborar resolução para escolas públicas e privadas quanto à web conferência e os impactos na educação pós pandemia.  Disse também que se procura relacionar o Enem com a Base Nacional Comum Curricular. 

Jefferson  Ribeiro, representante da União dos Estudantes, acha que o Ministério da Educação está desinformando a população, implantando "um modelo absurdo". Ele disse que o Ministério não escuta os estudantes  e por isso os de menor renda sofrem mais os impactos. “Não ouvem as entidades estudantis e querem  fazer o exame em meio à pandemia. Estudantes pobres não podem concorrer com estudantes de escolas privadas, que têm aulas remotas, cursinhos. É desumano”.

A representante do Ministério Público de Pernambuco, Raquel Borba, secretária ministerial do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Defesa dos Direitos Humanos, argumentou que a pandemia trouxe à tona as desigualdades sociais e  que na educação não foi diferente. Disse ainda que o MPPE vai atuar no sentido de trabalhar para a redução dessas desigualdades

O vereador Jairo Britto considerou que em condições normais já é mais difícil para quem vem da escola pública. Ele acha que o governo Federal não se preocupa com estudantes pobres e só aceitou mudar a data por causa da pressão da sociedade e do Congresso. “Esses estudantes não têm equipamentos para acompanhar e não dá para estudar sem aulas presenciais. Não há como marcar exame sem o ano letivo terminar”.

Rodrigo Coutinho relatou que ainda é estudante e sabe a importância do Enem na vida de todos. Disse que sabe das dificuldades do alunos de baixa renda e que a atuação do Ministério da Educação preocupa bastante porque ao mesmo tempo em que vai fazer consulta pública sobre as datas do exame, impõe dirigentes nas universidades, abolindo a escolha mediante votação. Considera que o acesso à informatização é diferenciado e preocupante. Disse que tem falado com professores de cursinhos que estão preocupados com o Enem, que acaba sendo pouco democrático, especialmente se mantivesse a data que estava programada. Pior ainda. Nem todos têm equipamentos até mesmo para votar em uma data para o novo exame.

Ivan Moraes ressaltou que é explícito o gosto desse governo, o Federal, e de seus gestores pela desigualdade, e que não se pode fazer concurso com pessoas em condições desiguais, sem equipamentos. “Os ricos têm aulas com todos os equipamentos e mídias, enquanto a rede pública não está sequer tendo aulas”. Ele disse que a secretaria de Educação do Recife "fala em voltar as aulas de forma remota, mas não tem equipamentos para distribuir e chega a  pedir doações de celulares". O vereador acentuou que a preocupação real é de fato sobre qual é a saída. “Acredito que a saída mais democrática para o momento é a suspensão do ano letivo”.

  

Em 11.06.2020, às 18h27.