Audiência pública debate política de moradia e os despejos no Recife

Na manhã desta quinta-feira (13), uma audiência pública foi realizada, no plenarinho da Casa de José Mariano, com o objetivo de discutir sobre "A política de moradia e os despejos na cidade do Recife". A iniciativa partiu do vereador Ivan Moraes (PSOL). Representantes do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), da Defensoria Pública de Pernambuco (DPPE) e da Secretaria de Habitação do Recife (SEHAB) compuseram a mesa.

No Recife, segundo o vereador Ivan Moraes, há um déficit habitacional de mais de 70 mil moradias, conforme o Plano Local de Habitação de Interesse Social de 2018.  Entre os anos de 2013 e 2023, foram removidas cerca de 1700 moradias de áreas pobres da capital pernambucana, muitas delas de Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS). Ivan Moraes justificou que o déficit habitacional da Região Metropolitana do Recife (RMR) é o terceiro maior entre as Regiões Metropolitanas do Nordeste e que o crescimento urbano sem ordenação tem causado impactos negativos. O parlamentar também citou dados do déficit no Estado de Pernambuco.

“O déficit na RMR vem chegando a quase 100 mil moradias, no que se refere apenas a questões relacionadas a habitação precária, coabitação e ônus excessivo, não incluindo nesse número população em situação de rua, ameaçadas por desastres socioambientais e ameaçadas por despejo, sendo Pernambuco, neste último caso, o segundo Estado do Brasil com o maior número de famílias ameaçadas de despejo, totalizando mais de 43 mil famílias”.  O vereador exibiu um vídeo demonstrando imagens de desapropriações realizadas na capital pernambucana. “O caso de Vila Esperança é um caso bem simbólico daquilo que a gente critica a forma como que foi feito. As pessoas voltaram do trabalho e viram suas casas pichadas com números e letras para depois saberem que iam perder suas casas”.

A Nota Técnica 04/2023 realizada pela assessoria do gabinete de Ivan Moraes em conjunto com o Centro Popular de Direitos Humanos (CPDH), a Cooperativa Arquitetura, Urbanismo e Sociedade (CAUS), que integram a rede BrCidades, foi mostrada por meio de slides pelas assessoras parlamentares Manuela Jordão e Luana Varejão. Elas detalharam os processos que vêm ocorrendo com as populações afetadas por desapropriações, exibiram diversos dados sobre despejos e citaram sugestões à gestão.

“A descontinuidade das políticas públicas e a desvinculação de uma visão estratégica, a longo prazo, são aspectos ruins para quem depende de políticas públicas de habitação. Você fica relegado a aguardar infinitamente por uma solução habitacional, dentro de um cadastro de Auxílio Moradia, recebendo uma indenização e sendo obrigada a sair da sua comunidade de origem. E esse é um processo que acomete pessoas que precisam ser removidas, seja por obra pública ou privada que precisa ser executada, pela execução de programas ou projetos estratégicos como, por exemplo, o Pró Morar, urbanização e melhoria da infraestrutura local, por meio de projetos não necessariamente vinculados a programas. Além de moradia em contexto de risco ou de fragilidade ambiental, em decorrência de catástrofes como em 2022, com várias famílias de Recife e Jaboatão dos Guararapes afetadas”, explicou Manuela Jordão.  

Luana Varejão deu sequência aos slides tecendo explicações sobre a política dos despejos no Recife. “Dentro do instrumento da indenização, vimos a utilização de pagamento de indenizações apenas por benfeitorias com a aplicação de fatores de depreciação sobre imóvel, mesmo se o imóvel está localizado dentro de uma área Zeis; coação para uma negociação administrativa onde as pessoas são pressionadas para negociarem e a falta de regras de prazo para pagamento. Em relação aos despejos, o total de desapropriações no Recife realizadas pela URB, entre os anos de 2013 até 2023, foi de 1847 com gasto total de R$95 milhões de reais, sendo três indenizações acima de R$1 milhão de reais e 392 abaixo de R$10 mil reais, um dado alarmante. Como propostas, sugerimos realizar a regulação fundiária dos territórios populares antes deles serem desapropriados por obras da Prefeitura; criar um mecanismo legal para pagamento mínimo de indenizações; não aplicar o fator de depreciação; ampliar para 30 dias o prazo de desapropriação das famílias”.

Representando o Ministério Público de Pernambuco (MPPE), a promotora Belize Câmara disse estar à disposição e elogiou a Nota Técnica 04/2023 apresentada. “Os problemas que foram apresentados aqui não são exclusividade do Recife. Eles estão espalhados por todo o Estado, então é de grande valia que a gente tenha conhecimento dessas distorções e desses dados. A gente oferece suporte a promotores de Justiça, mas também elaboramos projetos que fomentam políticas públicas. Esses dados são de extrema importância para o Centro de Apoio de Defesa do Meio Ambiente e a gente sabe que o Ministério Público tem a função constitucional de defensor e protetor dos direitos relativos à moradia, cidadania e direitos humanos. Então, eu fico à disposição para ser uma parceira nessa tarefa de contribuir para a construção dessa política pública”.

A representante da Promotoria de Habitação e Urbanismo do Ministério Público de Pernambuco, Clara Moreira, detalhou o Projeto Terra e Teto Lar de Direitos. “O Projeto Terra e Teto Lar de Direitos é uma parceria do CAO (Centro de Apoio Operacional) Meio Ambiente e CAO Cidadania e tem como finalidade dar suporte estruturado para a atuação de promotores do MPPE no âmbito da habitação e urbanismo, e passa primeiro por um levantamento de dados. Está no nosso cronograma de trabalho um grande levantamento e sistematização dos dados da situação dos conflitos fundiários e, também, da política habitacional em todo o Estado de Pernambuco. A partir desses dados, a gente vai começar a construir manuais de atuação para os promotores atuarem diante dos conflitos que surgem. As questões de despejos ou de reintegração de posse passam às vezes por várias promotorias distintas e a gente precisa estruturar a comunicação integrada da atuação das promotorias nesses casos de conflitos”.

José Fernando Debli, da Defensoria Pública de Pernambuco, ressaltou que as pessoas que procuram a Defensoria têm direito de serem contempladas com uma promessa concreta e citou que a gestão municipal deve prestar assistência para a regularização de imóveis. “As pessoas têm direito concreto e subjetivo de alternativa porque elas foram realmente despejadas, inclusive com uma burla da desapropriação que deveria ter sido feita, a priori, com uma indenização justa.  A Prefeitura deveria fornecer assistência técnica, e existe uma lei para isso, onde diz que a gestão municipal tem que fornecer essa assistência para auxiliar as pessoas a regularizarem o imóvel, seja em área de risco ou em casos em que as pessoas moram em um local sem alvará”.
 
Altair Correia, representante da Secretaria de Habitação do Recife (SEHAB), exibiu uma apresentação sobre planos, projetos e programas da Prefeitura do Recife no enfrentamento do déficit habitacional. “Um grande marco é a volta do Minha Casa, Minha Vida. Com a Lei Municipal 18.863/2021 que institui a Política Municipal de Habitação de Interesse Social - PMHIS, dispõe sobre o Sistema Municipal de Habitação de Interesse Social - SIMHIS, e institui elementos para elaboração do Plano Local de Habitação de Interesse Social - PLHIS do Município do Recife, temos um pouco mais de força nas ações voltadas à habitação dando um panorama melhor a gente. Com Minha Casa, Minha Vida em 2023 a gente conseguiu garantir a moradia com cerca de 2.000 unidades diretamente ao FAR (Fundo de Arrendamento Residencial) com a Caixa Econômica Federal, uma doação da União de muitos imóveis que nós ainda estamos solicitando. Precisamos desse levantamento para planejar melhor essas comunidades que vão ser afetadas nesses novos empreendimentos que também são necessários à fluidez da cidade”.

A Secretaria de Habitação do Recife detalhou dados sobre as unidades habitacionais e projetos futuros de habitação. “Nos anos de 2023 e 2024, foram 5.119 unidades habitacionais, dentre elas uma parte já foram entregues e outras em planejamento com editais prontos e as empresas cumprindo as questões de aprovação legal de projetos na Prefeitura. A Parceria Público-Privada (PPP) entra também com seis imóveis sendo três retrofits [técnica de revitalização de construções antigas] e vai vir um parque público voltado para locação social, mas também em parceria com o privado. Então a gente pode estudar para relocar essas famílias ou não, mas existe moradia no Cabanga prevista e a gente está tentando levar habitação em outras nuances, não só conjunto habitacional, como a locação social diretamente com a PPP. Com o Governo Federal vamos entregar 1200 habitações no Recife e o Vila Brasil 1 e 2 serão entregues, nesse mês, e convido todos e todas para participarem desse ato”.

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Em 13.06.2024