Frente pela Renda Básica promove reunião com Marcelo Freixo e Edmilson Rodrigues

Em sua segunda reunião, a Frente Parlamentar pela Renda Básica criada pela Câmara do Recife promoveu nesta sexta-feira (23), de forma remota, um debate com o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL) e o prefeito de Belém (PA), Edmilson Rodrigues (PSOL). Na ocasião, os convidados deram sugestões para o projeto de renda básica da capital pernambucana. A importância do cadastro social do programa e a necessidade de buscar ativamente os beneficiados foram alguns dos temas abordados.

A Frente Parlamentar pela Renda Básica é presidida pelo vereador Rinaldo Junior (PSB). Ao dar início à reunião, ele destacou o trabalho de escuta que vem sendo empreendido pelo grupo – na semana passada, foi ouvida a ex-ministra de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Márcia Lopes. “Esta frente é ampla de verdade. Estamos escutando especialistas no assunto, parlamentares, prefeitos. Queremos escutar todos que têm interesse em discutir renda básica no Recife. Estamos sistematizando todas as falas para colocá-las no projeto que vamos entregar ao prefeito João Campos (PSB). Temos certeza de que, após as ações de renda emergencial [implementadas pelo município], vamos conseguir um belo projeto de renda básica”.

A vereadora Dani Portela (PSOL) enfatizou que a renda básica é um instrumento de redução de desigualdades. Ela lembrou, ainda, que ela se tornou ainda mais necessária com a pandemia de covid-19. “A defesa de uma renda básica permanente é sobretudo uma defesa da justiça social. A pandemia aprofundou e escancarou as desigualdades sociais que já existem e mostrou a urgência de pensar em políticas públicas de estado que enfrentem a fome, a miséria e deem dignidade a população. No Brasil, o desemprego tem rosto: o rosto de uma mulher negra com baixa escolaridade. Defender a renda básica é trazer justiça social para um país com desigualdades profundas de gênero, raça e classe”.

O vereador Hélio Guabiraba (PSB) destacou a qualidade dos debates que têm sido feitos pela Frente. “É um assunto que interessa ao nosso país e à nossa cidade. Desde que começou essa pandemia, o nosso país tem sofrido muito. Quero dizer da minha felicidade de estar em uma equipe que tem o objetivo de se preocupar com as pessoas que vivem na nossa cidade e precisam da nossa ajuda. Nasci numa comunidade e conheço o que é sofrer dificuldade e passar fome”.

A vereadora Liana Cirne (PT) demonstrou que o parlamento municipal tem compromisso com a renda básica, e que deve formular um projeto que enfrente desigualdades de classe, gênero e raça. “Temos uma Câmara aliada e alinhada a esse projeto. Temos o desafio de pensar um programa de renda básica que tenha critérios transversais. Vejo com otimismo o empenho de nossos colegas para modelarmos o que vais ser um dos maiores programas sociais da nossa cidade. Esse projeto nasce em um contexto de profunda dor e dificuldade. Ao mesmo tempo, eu acredito que vamos construir uma marca fixa. Vamos atravessar esse período e deixar um benefício permanente”.

Já a vereadora Cida Pedrosa (PCdoB) apontou para a receptividade da gestão do Poder Executivo municipal para a proposta. “Tudo o que a gente ouve do governo Bolsonaro são cortes e mais cortes e nenhum compromisso com a vida humana. Então nós e o governo municipal do prefeito João Campos aprovamos um Auxílio Emergencial, num valor módico de R$ 150 reais, para famílias que estão inscritas no bolsa família e que não receberam o benefício”, disse. “Aqui na Câmara, estamos fazendo o dever de casa, escutando experiências de pessoas e da sociedade em geral para propormos ao poder municipal, que está muito sensível a essa causa. Estou muito esperançosa”.

Por sua vez, o vereador Ivan Moraes (PSOL) lembrou que a renda básica pretende ir além do auxílio emergencial municipal, que se estendeu por apenas duas parcelas mensais. “O PSOL fez uma pesquisa que mostra que, se mexer no orçamento com coragem, a gente consegue tirar até R$ 125 milhões que poderiam financiar uma renda básica sistemática, com R$ 350 ao mês para 30 mil pessoas”, afirmou. “A gente poderia tirar dos contratos da publicidade e do lixo, que são muito caros, e do custeio. O próprio prefeito João Campos já anunciou uma economia no custeio de mais de R$ 100 milhões. Então, compreendemos que hoje temos uma conjuntura orçamentária que nos permite implementar uma renda básica que não seja apenas esse auxílio emergencial – que é necessário, mas insuficiente”.

Uso estratégico do cadastro – Em sua intervenção, Marcelo Freixo lamentou o retorno da fome aos lares brasileiros. “Nunca imaginei que, em 2021, estaríamos aqui debatendo a fome no Brasil novamente. Temos, hoje, 9% dos mais de 200 milhões de brasileiros em situação de miséria, famintos. E mais de 120 milhões de brasileiros em situação de insuficiência alimentar – que nada mais é do que gente sentindo fome. É uma situação social das mais graves. Nesse sentido, precisamos pensar, de um lado, algo humanitário, imediato”.

Segundo o deputado federal, porém, o cadastramento dos beneficiados permite aprofundar o acompanhamento social de forma estratégica, facilitando a implementação de outros mecanismos de inclusão. “De outro lado, a renda básica não é auxílio emergencial. Renda básica é política pública: ela se relaciona com educação, saúde, assistência e moradia. Gera, por exemplo, um cadastro. Nesse cadastro você tem dados fundamentais para geração de políticas públicas de ingresso à experiencias de cidadania. Não é só dinheiro na mão das pessoas”, explicou. “Esse cadastro é fundamental para políticas públicas de inclusão e de enfrentamento a desigualdade. Pode ser acompanhada a evasão escolar, a juventude. Quando falamos de renda básica, falamos da possibilidade de as pessoas serem incluídas dentro de políticas amplas de saúde, educação, moradia, assistência”.

Renda básica na prática – Na reunião, Edmilson Rodrigues deu detalhes sobre o “Bora Belém”, programa de renda mínima da capital paraense implementado neste ano.

“A filosofia dessa proposta é a de que vivemos num país muito desigual, mas muito rico quando se considera o Produto Interno Bruto. Como se pode explicar que tenhamos tanta gente na pobreza, na miséria e na extrema pobreza, passando fome? O mínimo que o país deve fazer é dar as condições de dignidade para acabar com a fome”, defendeu. “Lutar por essa política permanente, uma política de Estado que garanta uma renda básica para todos os brasileiros, é uma meta estratégica”.

Rodrigues, que já havia assumido a Prefeitura de Belém entre 1997 e 2005, contou que, à época, havia mais espaço orçamentário para a implementação de programas assistenciais, como o Bolsa Escola. Mas o “Bora Belém”, segundo ele, enfrentou mais desafios para sair do papel.

“Eu ouvi de gente que me apoiou na campanha o discurso de que o orçamento estava engessado. Como se faz, se as despesas fixas necessitam de investimentos? Entramos no governo dizendo de onde iríamos manejar os recursos. O orçamento não previa, mas remobilizamos recursos para viabilizar o cumprimento da palavra. Fizemos um investimento de R$ 60 milhões inicialmente”, relatou. “Sei que João Campos vai ouvir de algum técnico da área financeira: não há dinheiro. Mas o debate na Câmara vai criar as condições e a legitimidade, somadas à vontade política e à sensibilidade social. E esse debate vai transformar a lei em letra viva, em compromisso com a humanidade”.

Assim, foi feito um recorte do CadÚnico do município que identificou 22.700 famílias em miséria e extrema miséria. O benefício foi mensurado de acordo com o número de filhos de cada família: R$ 150 (um filho), R$ 350 (dois ou três filhos) e R$ 450 (quatro ou mais filhos).

O passo seguinte foi montar uma equipe de 700 servidores para uma operação de busca ativa dos beneficiados. Eles foram a campo encontrar as famílias cujo telefone e endereço haviam mudado, além de verificar se elas ainda se encontravam nas condições socioeconômicas do cadastro. “Quando não dá para atender todo mundo, deve-se atender os que estão em situação de miséria. Essa busca ativa nos permitiu compatibilizar o cadastro feito anteriormente, fazer a limpeza do que era, eventualmente, fraude, e cadastrar novas pessoas para atingir o número de famílias inicial. Tem sido um desafio, mas temos avançado muito”.

Respondendo a questionamentos de Ivan Moraes sobre mobilização dos recursos e a forma de aprovação do projeto da renda mínima, o prefeito de Belém pontuou que será necessário criar um alinhamento firme entre os poderes Executivo e Legislativo do Recife. Em Belém, o projeto partiu do Poder Executivo, que tem essa prerrogativa em casos de criação de despesas. Já no Recife, como a matéria será apresentada pela Câmara, os parlamentares precisarão se articular com a Prefeitura para que ela não seja vetada por vício de constitucionalidade.

Para além da renda básica – Ao final do encontro, Edmilson Rodrigues recomendou que, além do programa de renda mínima, a capital pernambucana criasse um programa de capacitação coletiva e microcrédito para beneficiados. Ele mencionou que, em Belém, está em operação um programa baseado no Método de Capacitação Massiva do sociólogo recifense Clodomir Morais.

“É importante que não passe só a renda básica. Criamos o Banco do Povo. É um fundo de solidariedade com duas funções: preparar para o trabalho, incentivando a criação de cooperativas populares, e garantir o microcrédito para dar autonomia financeira aos beneficiários do programa”, explicou. “O ideal é que uma mãe beneficiada, junto com outras, constitua uma cooperativa de serviços, por exemplo”.

Em 23.04.2021, às 19h39