Corte orçamentário no Ministério da Educação é discutido em reunião pública
A parlamentar salientou as dimensões da redução orçamentária ao dar início à reunião. Ela lembrou que o sucateamento do ensino superior público ocorre há alguns anos e atinge, principalmente, estudantes que precisam de assistência estudantil. “A verba disponível para investimento e manutenção caiu para um patamar equivalente ao que foi dado para a universidade no ano de 2004. A diferença é que, naquele momento eram 574 mil alunos e 51 instituições. Hoje, são 69 universidades e 1,3 milhão de estudantes. O setor de educação já enfrenta grave dificuldades desde a emenda constitucional 95, a ‘PEC da Morte’, que congelou investimentos nas áreas da saúde e da educação – que, na pandemia, estamos vendo serem cruciais”.
Ao mencionar a crise sanitária do coronavírus, Portela indicou que as tentativas de desmonte do ensino superior público sabotam as perspectivas de progresso do País. “Quero lembrar que as universidades públicas são responsáveis por 90% das pesquisas produzidas no território brasileiro. Os cortes não atingem só o ensino, mas o desenvolvimento científico do nosso país. Eles deixam o Brasil mais dependentes de outros países”.
A vereadora não deixou de pontuar que a população pode ficar desassistida por serviços púbicos ofertados pelas universidades federais. “Sem recursos para pagar o básico para o seu funcionamento, muitas instituições correm o risco de paralisar suas funções e suspender atividades de pesquisa e serviços de atendimento essenciais para a sociedade, como os hospitais universitários. Podem até mesmo anunciar a possibilidade de fechar, como foi o caso da Universidade Federal do Rio de Janeiro”.
O vereador Ivan Moraes (PSOL) também participou da reunião e disse que o sucateamento das universidades faz parte de uma escolha política pelo afastamento de pessoas de espaços de conhecimento. “Não queremos que as universidades apenas sobrevivam. Queremos que elas vivam, cresçam e floresçam. No período de 15 anos entre a minha primeira entrada na universidade federal e a minha colação de grau no mestrado, a quantidade de pessoas negras, trans e dos mais diversos bairros se multiplicou. A qualidade técnica e humana das universidades tende a ser cada vez maior conforme mais sujeitos entram nesses espaços e contribuem com suas vivências”, explicou. “É lamentável que, hoje, estejamos vivendo sob a égide de um governo que é contra a ciência e o progresso da humanidade. Quando se corta recurso de universidade, não se trata de economia. Trata-se de uma decisão arbitrária, para que menos gente tenham acesso ao conhecimento.”
Segundo a vereadora Cida Pedrosa (PCdoB), recordou que a universidade pública sobreviveu ao discurso das privatizações dos anos 1990, mas que o projeto atual seria ainda mais destrutivo. “Aniquilar a universidade pública é próximo do fascismo, porque é aniquilar o conhecimento e possibilidades de futuro. Temos um ‘despresidente’ da República que acha que o Brasil pode viver sem ciência e educação e isso é implementado. Só se pode ter um corte como esse se se quer mesmo aniquilar”.
Ela contou, ainda, das experiências que teve no Executivo municipal, em que presenciou o papel das universidades federais no suporte a políticas públicas. “A universidade tem uma relação direta e prática com a cidade. São cidades dentro da cidade. São cidades que prestam serviços, fornecem ciências e empregam. O Hospital das Clínicas foi quem recebeu os doentes de covid-19 da Amazônia. Na UFRPE, temos o melhor hospital veterinário. Quando fui secretária municipal de Meio Ambiente, coordenei realizei em parceria com o UFPE o Parque Capibaribe, que é hoje o projeto mais importante para reviver o rio. Quando fui secretária municipal da Mulher, a gente formava mulheres vítimas de violência a partir de um convênio com a UFRPE”.
Professora da Faculdade de Direito da UFPE, a vereadora Liana Cirne (PT) Esse é um projeto de desmonte das universidades federais. Tem o propósito de sucatear nossas universidades não apenas com os fins de privatização. Também é [ameaçar] um projeto de democratização que vinha sendo feito com muito êxito nos governos do PT, que descentralizou universidades, interiorizou e atingiu mais alunos. Quando entrei como professora na universidade, tínhamos um perfil muito diferente de estudantes. Estávamos nos preparando para fazer o enfrentamento do racismo institucional. O corte no orçamento das universidades é um corte no projeto de País pelo qual lutamos”.
O reitor da Universidade Federal Rural de Pernambuco, Marcelo Carneiro Leão, informou que, no caso da instituição, o corte representou um retrocesso orçamentário aos níveis do começo da década passada. Com o aperto nas contas, a universidade não tem mais recursos para fazer investimentos e vai precisar se adaptar para pagar as contas do custeio, como água e energia. “Em relação ao ano passado, o orçamento deste ano teve um corte 21%. Sobre esse orçamento cortado, o MEC ainda bloqueou 13,8%. O investimento da Universidade, hoje, é zero. No orçamento de custeio, a Universidade vai receber em torno de R$ 30 milhões a menos. Infelizmente, vamos ter que tomar medidas, reduzir serviços e postos de trabalho”, disse. “O grande desafio da mobilização é um projeto de lei no Congresso Nacional que faça a recomposição do orçamento, pelo menos, no valor nominal do ano passado. O que já tem perdas, porque teve a inflação. Se nada for recomposto, no último trimestre deste ano nenhuma universidade vai conseguir se manter”.
Reitor da Universidade Federal de Pernambuco, Alfredo Gomes salientou o papel social e estratégico da ciência, da tecnologia e das universidades. “As universidades são fundamentais para o País e imprescindíveis ao seu projeto de desenvolvimento social, econômico, cultural, humano e ambiental. Dessa forma, têm que ser bem cuidadas, com políticas de Estado que garantam a sua perenidade”, afirmou. “Contribuímos de forma sistemática para a formulação de políticas em diferentes áreas de atuação: transporte, mobilidade, segurança pública, educação. As universidades desenvolvem projetos de pesquisa essenciais, por exemplo, para o enfrentamento à covid-19. Os cortes implicam em falta de manutenção adequada dos laboratórios e equipamentos de pesquisa, e na incapacidade de aquisição de matéria-prima”.
De acordo com Gomes, na UFPE os cortes vão afetar, ainda, o número de bolsas de assistência aos estudantes – mais de 50% dos alunos da instituição provêm de famílias de baixa renda. “O corte nos recursos para manutenção e funcionamento é da ordem de R$ 30 milhões. O nosso orçamento regride a 2011. Esse corte, de 20%, se acrescenta a um outro corte 8% que houve em 2020. Em outras palavras, esses recursos são insuficientes para mantermos em pleno funcionamento a universidade durante este ano. Por isso, a nossa luta é pela recomposição do orçamento. É fundamental a articulação com o Congresso Nacional para que tenhamos um projeto de lei que faça a designação de recursos suplementares para que as universidades continuem a cumprir as funções essenciais que a sociedade tão bem designou”.
A presidenta da Associação dos Docentes da Universidade Federal Rural de Pernambuco (ADUFERPE), Nicole Pontes, frisou que professores e técnicos administrativos mantiveram as universidades funcionando mesmo com os cortes orçamentários e diante da pandemia de covid-19. Ela lembrou do papel da universidade pública para a criação de polos de desenvolvimento como o Porto Digital do Recife. “O ‘desgoverno’ federal tem como projeto uma política de morte. Não apenas a morte real da sua população, como temos visto com os números da covid-19, mas também com o uso desse momento para tentar controlar nossa capacidade de resistência em termos políticos. O ‘passar a boiada’ significa passar todos esses projetos de corte orçamentário, uma reforma administrativa que faz parte de um pacote que visa destruir o serviço público do nosso País. Vai destruir a possibilidade de trabalho no SUS e nas universidades públicas, acabando com um conjunto de direitos. Esses cortes não podem permanecer”.
Pró-reitora de Ensino e Graduação da UFRPE, Socorro Lima apontou que, no Brasil, o desenvolvimento educacional foi patrocinado pelo Estado. “Os cortes trazem muitas preocupações. A história da educação do Brasil é marcada pelo implemento do Estado. É a história da educação pública. As universidades são, também, formadoras. Quem carrega o ensino de qualidade são as universidades federais. Tem cursos de licenciatura que sequer são ofertados pela iniciativa privada. Tudo o que foi construído foi pela esfera pública”, analisou. “É muito estranho ver o Brasil na contramão de outros países. Acompanho o desenvolvimento educacional de vários países onde se privatizou e onde estão se buscando novas formas de inserção para acesso de pessoas de forma pública. Os cortes trazem muitas preocupações”.
Representante da União Nacional dos Estudantes, Victória Pinheiro também mencionou os impactos dos cortes das universidades para o projeto de um ensino superior popular. “Sofremos cortes sistemáticos desde 2016. Naquele ano, estudantes de Norte a Sul do Brasil se mobilizaram contra a chamada ‘PEC da Morte’, para falar o quanto aquilo era perigoso e retiraria direitos sociais da nossa população. Hoje, vemos esses cortes confirmando aquilo que já era denunciado. Estamos sob ataque”, indicou. “Esses cortes afetam a pesquisa, a infraestrutura das universidades, o pagamento de despesas básicas, o pessoal terceirizado, assistência estudantil, que é fundamental para vários estudantes brasileiros. Neste ano, mais de 92 mil bolsas de pesquisa da Capes poderão ser cortadas e várias universidades falaram que vão fechar”.
Em 20.05.2021