Frente Parlamentar pela Renda Básica ouve especialistas no tema
O presidente fez uma breve retrospectiva de diálogos anteriores promovidos pelo colegiado. “Esta Frente tem discutido o tema com grandes especialistas e políticos do Brasil. Depois de debater com a ex-ministra Márcia Lopes, o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL), o prefeito de Belém do Pará, Edmilson Menezes (PSOL), e [o ex-senador] Eduardo Suplicy (PT), vamos falar com pessoas que entendem muito desse tema também. Hoje, teremos um debate muito técnico”.
Uma das componentes da Frente, a vereadora Dani Portela (PSOL) destacou a necessidade de implementação da renda básica universal como forma de superar desigualdades no país – em especial com a crise da pandemia de covid-19. Ela lembrou que o país voltou ao Mapa da Fome e ocupa, atualmente, o 14º lugar no ranking internacional do desemprego.
“Esse tema é importante e urgente. O Parlamento tem que colaborar com a necessidade de enfrentar desigualdades. Precisamos chegar em uma proposta conjunta, que começa no Parlamento, mas dialoga com a sociedade civil, com a academia, com outros políticos. Estamos fazendo o debate em um momento histórico, nunca vivido antes”, disse. “Estamos entendendo a urgência da aprovação desse projeto no meio de uma crise pandêmica sem precedentes e que não traz só consequências sanitárias, mas econômicas e sociais profundas. A pandemia não criou as desigualdades, mas as aprofundou. Elas ficaram muito evidentes”.
A vereadora Liana Cirne (PT) repercutiu os debates sobre a inserção da renda básica na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2022, que será votada em breve na Câmara do Recife. A parlamentar salientou, ainda, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determina a implementação da renda básica no país.
“Temos uma tarefa muito importante, que é a de fazer o Poder Legislativo, político e democrático por excelência, tomar a dianteira em relação ao Poder Judiciário. Estamos com um ônus judicial. O STF determinou que a renda básica deverá estar nos orçamentos dos municípios em 2022”, afirmou. “Os municípios que não a incluírem nos seus orçamentos por força política o farão por meio judiciário. E não queremos estar a reboque. A nossa Legislatura não só quer colocar um fim no déficit histórico da renda básica, mas estar à frente. Queremos uma renda básica que seja universal e diversa, atendendo a demandas que tenham a cara do Recife, que é marcado pela desigualdade”.
O vereador Hélio Guabiraba (PSB), que também faz parte da equipe, fez um elogio à participação dos convidados e dos demais membros da Frente. Ele recordou, também, que em sua trajetória viveu na pele os desafios da desigualdade socioeconômica brasileira. “Quero parabenizar a esta Casa pela escolha dos vereadores desta Comissão. Sou um ex-pedreiro que virou vereador do Recife. Moro na Guabiraba desde que nasci. O que discutimos aqui vivencio todos os dias: são as dificuldades do povo brasileiro e da nossa cidade. Tenho orgulho de participar de uma comissão que luta para encontrar um caminho para sanar essas dificuldades”.
Desigualdade estrutural - A supervisora técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos em Pernambuco (DIEESE-PE), Jaqueline Natal, além de parabenizar a Câmara do Recife pela iniciativa da criação da Frente Parlamentar pela Renda Básica, destacou que o tema é histórico e estrutural no Recife. "Acho que é uma ousadia um parlamento discutir e elaborar política pública, porque é o parlamento que conhece mais a realidade enquanto representantes do povo, das comunidades, dos municípios", afirmou.
Ao apresentar a função do DIEESE com relação ao estudo do mercado de trabalho feito em Pernambuco, a supervisora técnica apresentou elementos "que vivemos num mundo capitalista onde homens e mulheres nascem, crescem e ao crescer, para sobreviver, têm a sua força de trabalho para poder aferir renda", afirmou. "A Constituição de 1988 garantiu que era dever e obrigação do Estado assegurar os direitos sociais básicos, que são: educação, saúde, segurança assistencial, social, alimentação, trabalho, previdência social, moradia, proteção à maternidade, proteção a infância, transporte".
"Esse conjunto de ações do Estado brasileiro lançou diversos escopos para tornar esses direitos sociais como direitos concretos, e é isso o que essa Frente está discutindo: transformar um direito concreto em um direito existente e materializado em ação. Só que estamos em um momento complicado e eu não consegui resistir a não problematizar isso, porque a nossa República Federativa tem uma grande concentração de poderes e dentre eles, o maior de arrecadação é no Poder Central. Desde 2016 a gente vem na trajetória de desmonte do papel do Estado, principalmente do que tange aos direitos sociais. O conjunto de medidas não é só a falta de dinheiro, mas a regra que impede que, mesmo havendo dinheiro, você não possa fazer política pública porque tem um teto de gastos", enfatizou Jaqueline Natal.
Jaqueline completou que o que está em disputa, hoje, é o papel do Estado na economia, e que a renda básica é "uma disputa de um modelo de um país que a gente quer". Ela destacou que omundo capitalista não é inclusivo. "Por isso eu trouxe os dados de reestruturação produtiva no mundo, que já está discutindo que parte considerável das pessoas que estão vivas não vão se encaixar nesse mercado de trabalho. Esse mercado super evoluído nunca vai ser hegemônico, porque na história do capitalismo nunca teve uma hegemonia do trabalho", ponderou.
"Eu sei que é um discurso político, mas isso é política. Dinheiro no país, tem, o DIEESE tem um documento que discute fontes de financiamento de políticas públicas, tem que olhar a política e olhar os que são mais excluídos desse conjunto", finalizou a supervisora técnica.
Outro caminho - Por sua vez, o professor do Departamento de Economia da UFPE, Pedro Lapa, evidenciou a novidade da criação da Frente e que ela ganha o reforço de mandatos importantes, como das vereadoras Dani Portela (PSOL) , Liana Cirne (PT) e dos vereadores Rinaldo Júnior (PSB), Hélio Guabiraba (PSB). "O que fazer? se é necessário e urgente e temos esse suporte legislativo para empreender essa palha, então façamos e vamos construir objetivamente esse programa de renda mínima. Essa construção é um passo teórico no sentido de fixar alguns conceitos de partida", disse.
O professor questionou se o trabalhador sabe como o orçamento é composto e falou da importância de dialogar com os trabalhadores sobre o que é necessário, e o financiamento da política social de renda básica robusta e permanente. "A importância disso é porque essa Frente Parlamentar está apostando numa proposta de estruturação de um política pública, e não uma resposta a essa crise momentânea que estamos vivendo. Existe a necessidade e existe a forma de atender a essas necessidades. Essa é a forma como entendemos que podemos colaborar numa atividade tão essencial", pontuou.
Como sugestão de desenho para a iniciativa, Pedro Lapa mencionou três passos a serem seguidos: 1. um pesquisador de referência e método de referência para análise do orçamento em construção; 2. um método de abordagem do trabalhador para a definição de suas necessidades a medida que o material for se apropriando pelos técnicos; 3. militância. "Nesse programa, a nossa responsabilidade é contribuir para a sistematização e trazer de volta para um diálogo com os legisladores. Precisamos ser rápidos e certeiros na iniciativa", explicou.
Ao ser perguntado pelo internauta Ricardo Amaral sobre o entendimento de neoliberalismo que passa por um momento de crise ou ruptura, se a conjuntura pode beneficiar a implementação da renda básica, o professor respondeu achar que "esse é o exercício necessário como o inimigo pensa". "Qual é a força que ele tem hoje? Essa perversão não é uma perversão de capitão, é uma perversão histórica que envolve a embaixada dos EUA, grandes corporações, imprensa corporativa, forças armadas e os ricos desse país, e eles estão muito bem contemplados".
Pedro Lapa ressaltou, ainda, que o Estado está passando por um desmonte e "não vai parar por aqui, vivemos o pior momento da história do Brasil, isso porque a gente não sabe que na próxima semana será pior. O erro de quem defende um auxílio emergencial é porque não percebe que ele tem que ser permanente, porque essa é a tendência que tem que ser desenhada. A renda básica tem que ser permanente, porque enfrentamos um inimigo que fará com que seja assim até que a correlação de força permita uma mudança de rumo", complementou.
14.05.2021