Câmara promove reunião pública sobre a redução de danos no contexto do uso de drogas

Um conjunto de cuidados, individuais e coletivos, direcionados para pessoas que usam, abusam ou dependem de drogas. É essa a definição da estratégia de redução de danos, que foi tema de uma reunião pública realizada pela Câmara do Recife nesta quinta-feira (1º), de forma virtual. O debate foi promovido por iniciativa do mandato do vereador Ivan Moraes (PSOL).

Ao abrir o evento, o parlamentar lembrou que a redução de danos foi alvo de discussões recentes no Poder Legislativo municipal, o que motivou a reunião pública. “A redução de danos é um tema que não deveria mais ser polêmico, mas que ainda causa muitas dúvidas nas pessoas da nossa cidade. Recentemente, tivemos uma discussão muito acalorada durante o debate da Lei de Diretrizes Orçamentárias, em que o nosso mandato tentou inserir nas diretrizes das políticas sobre drogas o foco na redução de danos”, afirmou. “Não conseguimos fazer com que essa emenda fosse aprovada, mas despertamos o interesse de muitos vereadores e vereadoras”.

Moraes argumentou que a estratégia visa se contrapor à chamada política de guerra às drogas, que buscou criminalizar e reprimir o uso dessas substâncias. De acordo com ele, a estratégia da proibição é ineficaz e gerou resultados negativos, como a violência. “Não adianta repetir as mesmas coisas esperando resultados diferentes. Estamos há quase um século com políticas proibicionistas e o que temos visto é cada vez mais pessoas padecendo, encarceradas e morrendo, muito mais pela política proibicionista do que pelas substâncias propriamente ditas”.

Após a apresentação de um vídeo da campanha “Acolha. Não Puna”, produzido pela Escola Livre de Redução de Danos, a vereadora Dani Portela (PSOL) também fez uso da palabra. De acordo com ela, posicionamentos políticos que insistem em apostar nas políticas de drogas baseadas na ação policial têm atrasado as discussões sobre o tema. “Esse é um debate fundamental para fazer no Recife nesta conjuntura. O aumento do conservadorismo se reflete nas Casas Legislativas estaduais e municipais. A forma de tratar as drogas não como uma questão de saúde pública, mas ainda na perspectiva punitivista, impregna o discurso da maioria dos parlamentares e das parlamentares. O debate sobre acolhimento e saúde pública tem sido desvirtuado”.

Representante da Escola Livre de Redução de Danos, Priscilla Gadelha, deu detalhes sobre o trabalho realizado pela entidade em busca de direitos e da autonomia. “Não acreditamos no assistencialismo para as pessoas em situação de rua, mas na garantia de direitos. A redução de danos não é sobre tirar ou substituir por outra droga, mas sobre olhar uma situação e ter um cuidado com aquilo. Precisamos ‘acolher e não punir’ porque vivemos em um país de lógica punitivista, que encarcera consideravelmente, e a realidade de violência não muda. Não queremos manter um modelo que continua torturando, matando, negligenciando, encarcerando, isolando pessoas”.

Márcio Muniz, um dos integrantes do Movimento Nacional da População em Situação de Rua que participaram da reunião, deu seu depoimento sobre a sua aproximação com a ideia de cuidado em liberdade promovida pela política de redução de danos. De acordo com ele, foi preciso se deslocar do Recife para ter acesso a esse tipo de atenção em saúde. “A comunidade terapêutica só serviu para me alienar, para fazer com que eu acreditasse que eu não era merecedor de viver em sociedade. Minha ida à Caruaru foi por falta de espaços no Recife que respeitassem a minha singularidade, com que eu pudesse continuar minha vida com a redução de danos”.

Também integrante do Movimento Nacional, José Nilton Monteiro destacou que o avanço das comunidades terapêuticas representa um retrocesso na construção de um atendimento em saúde mental integrado à sociedade. “A redução de danos veio para ficar porque traz resultados positivos. Se não fosse a ciência e a tecnologia proporcionada pela redução de danos, aqui não estaríamos. Neste período pandêmico, especificamente, as comunidades terapêuticas também têm tido um fator covarde. Além de estar ludibriando, escravizando e enclausurando, o que se pratica é o modelo biomédico contra o qual a gente já lutou”.

Márcio Muniz, um dos integrantes do Movimento Nacional da População em Situação de Rua que participaram da reunião, deu seu depoimento sobre a sua aproximação com a ideia de cuidado em liberdade promovida pela política de redução de danos. De acordo com ele, foi preciso se deslocar do Recife para ter acesso a esse tipo de atenção em saúde. “A comunidade terapêutica só serviu para me alienar, para fazer com que eu acreditasse que eu não era merecedor de viver em sociedade. Minha ida à Caruaru foi por falta de espaços no Recife que respeitassem a minha singularidade, com que eu pudesse continuar minha vida com a redução de danos”.

Também integrante do Movimento Nacional, José Nilton Monteiro destacou que o avanço das comunidades terapêuticas – um modelo associado a instituições religiosas e que é focado no isolamento do indivíduo – representa um retrocesso na construção do atendimento em saúde mental. “A redução de danos veio para ficar porque traz resultados positivos. Se não fosse a ciência e a tecnologia proporcionada pela redução de danos, aqui não estaríamos. Neste período pandêmico, especificamente, as comunidades terapêuticas também têm tido um fator covarde. Além de estar ludibriando, escravizando e enclausurando, o que se pratica é o modelo biomédico contra o qual a gente já lutou”.

Para a presidente do Conselho Regional de Psicologia, Alda Roberta Campos, explicou que o atendimento psicológico no contexto das drogas não pode ter como foco apenas a substância que é utilizada. “Fazer psicologia é respeitar a individualidade, levando em consideração o tripé formado pela pessoa, pela relação com a substância e pelo contexto socioeconômico e cultural em que a pessoa está inserida. Quando fazemos qualquer ação em que o foco é a substância, não estamos fazendo nem psicologia, nem redução de danos. Outra coisa é a laicidade do Estado e da psicologia. Psicologia não se mistura com religião. Ela precisa se basear na ciência e na ética”.

Vice-presidente do Conselho Municipal de Políticas sobre Drogas (Compad) e representante da Marcha da Maconha, Jorge Cavalcanti destacou que o órgão – no qual a Câmara possui um assento hoje ocupado pela vereadora Michele Collins (PP) – precisa ter como protagonistas os integrantes da sociedade civil. Cavalcanti refletiu, também, sobre a problemática do repasse de verbas públicas para comunidades terapêuticas. “A impressão que eu tenho é que esta gestão[municipal] que começa vai seguir o que foi realizado na administração de Geraldo Julio (PSB). Nem todas as comunidades terapêuticas são centros de violações de direitos, mas muitas são. Também são um negócio que lida com o dinheiro público. E esse dinheiro público não tem muita transparência”.

Psicóloga e técnica de reinserção social, Larissa Farias representou o Programa de Atenção Integral aos Usuários de Drogas e seus familiares (Programa Atitude), do Governo do Estado. “Somos um programa com base na assistência social. Temos casas de acolhimento, a questão do aluguel social. Temos vários desafios em relação ao preconceito com esse cuidado e há enfrentamentos que precisam ser feitos para trazer a condição de cidadãos para os usuários”.

Ao final da reunião, o vereador Ivan Moraes abriu espaço para participantes que se inscreveram durante a transmissão e para o debate entre os integrantes da mesa virtual. Dentre os temas abordados, estavam o racismo estrutural associado à proibição de drogas, a necessidade de reconhecimento do profissional de redução de danos, e os programas de habitação para pessoas em situação de rua.

Em 01.07.2021