Audiência pública debate importância de cuidados paliativos para a saúde pública
Na abertura da audiência, Calheiros indicou a relevância crescente dos cuidados paliativos em sociedades que estão envelhecendo, como o Brasil. Ele ressaltou que Pernambuco tem obtido avanços na área, mas que é preciso realizar mais investimentos públicos. “Sabemos que a população está ficando mais velha. Com essa inversão, há uma transição epidemiológica, uma mudança do quadro das doenças. As doenças degenerativas começam a ser prevalentes e precisamos estar preparados para essa mudança”, disse. “Os cuidados paliativos precisam de um apoio maior do poder público. É uma área que cresce em formação e que precisa de mais incentivo. Pernambuco está na vanguarda dos cuidados paliativos. Seu Conselho Regional de Medicina é um dos poucos a terem uma Câmara Técnica, a pioneira, de cuidados paliativos”.
Nesse contexto, o parlamentar apresentou o projeto de lei nº 333/2021, de sua autoria, que visa a instituir no calendário de eventos do Recife a Semana Municipal da Conscientização dos Cuidados Paliativos. O evento aconteceria na semana do segundo sábado de outubro, que marca o Dia Mundial dos Cuidados Paliativos. “Temos avanços só com o fato de estarmos nesta audiência pública. Mas ter desdobramentos disso e ações práticas é ainda melhor”.
Uma das convidadas da audiência foi a presidente da Câmara Temática de Cuidados Paliativos do Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (Cremepe), Zilda Cavalcanti. Ele salientou a diferença entre os cuidados de fim de vida e os cuidados paliativos – estes últimos são mais amplos e devem ser iniciados precocemente, de forma proporcional à evolução da doença. “Não viemos falar de morte, mas de vida plena e digna. O destino é um só: todos sabemos que é a morte. O que faz a diferença é a viagem, que tem que ser amorosa, calorosa. Como a gente pode tornar essa viagem menos sofrida, menos dolorosa para os nosso pacientes?”, refletiu.
Cavalcanti apontou a necessidade de formar profissionais para os cuidados paliativos e frisou o caráter multiprofissional desse tipo de atenção. “O cuidado é integral e foca na qualidade de vida. Para isso, precisamos do controle absoluto dos sintomas. Vemos o sofrimento que vem com a doença de forma multidimensional. O sofrimento não é só físico: é social, psíquico, espiritual. Para trabalhar com essa abordagem, precisamos de uma equipe multidisciplinar, porque nenhum profissional sozinho vai dar conta de tantas dimensões do sofrimento”.
Coordenadora de comunicação da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), Nahãmi Cruz elogiou o projeto de lei de Tadeu Calheiros ao repercutir o tema da campanha de 2021 do Dia Mundial dos Cuidados Paliativos, “Não deixe ninguém para trás – Equidade no acesso a Cuidados Paliativos”. Ela reforçou a importância de formação de profissionais e de construção de uma política local de cuidados paliativos, o que já é uma realidade em estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Goiás.
“Não temos uma política municipal nem estadual de cuidado paliativo. Talvez seja esse o primeiro passo para fazer essa política acontecer. Tendo esse tema vindo com a preocupação de Tadeu, a gente vê que o Recife não quer deixar ninguém para trás. Queremos, com essa proposta, trabalhar com a formação dos profissionais e levar informação à população. Trabalhando com educação e saúde, as pessoas desmistificam o que são os cuidados paliativos”, afirmou. “Não cuidamos de morte: cuidamos de vida e de pessoas, aliviando sintomas que podem vir com o adoecimento. Cuidar da integridade humana, da dignidade da vida e respeitar os direitos humanos são os grandes papeis do paliativista”.
O presidente da seccional pernambucana da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), Sergio Durão, analisou as transformações positivas experimentadas pela cultura do cuidado em anos recentes. Ele defendeu o investimento público, em parceria com o setor privado, para fazer crescer o setor de cuidados paliativos, visto como pouco lucrativo pela indústria farmacêutica. “Compomos uma geração que tem visto a cultura do cuidado se transformar rapidamente. Essa cultura mudou o foco das decisões médicas independentes das vontades dos pacientes e famílias e que é mais humanizada. É uma cultura mais preocupada com o que é de valor para cada pessoa, e não para o que o médico ou a equipe acha”, disse. “Recife, de fato, cresceu bastante e é uma vanguarda nacional. Mas precisamos avançar muito para o interior. Levar esse conhecimento e essas experiencias é uma das missões que a direção atual da SBGG assumiu”.
O presidente do Cremepe, Maurício Matos, também participou da audiência. Ele falou sobre o impacto que os cuidados paliativos podem ter na vida de pacientes e familiares – e elogiou a proposta apresentada por Tadeu Calheiros. “É maravilhoso poder tratar uma doença rara e complexa, operar um paciente por horas e horas e ele sair bem. Mas dar um conforto no momento de desesperança não tem preço. E essa atenção dos paliativistas tem que ser valorizada e estimulada. Precisamos ter cuidados paliativos em todos os hospitais. Temos que ampliar esse acesso, que ainda é muito restrito”, considerou. “Essa proposição [do vereador] é de uma magnitude muito grande. Ela pode, chamando a atenção para esse problema, sensibilizar gestores municipais e estaduais para que os cuidados paliativos possam ter um destaque”.
A coordenadora do Serviço de Atenção Domiciliar (SAD) da Secretaria de Saúde do Recife, Simone Luna, representou a pasta na audiência pública. Ela detalhou a operação realizada pelo serviço, implantado em 2010 na capital. “Temos 540 leitos domiciliares do Recife, contemplando todos os distritos sanitários. Desses leitos, 142 são de cuidados paliativos, sejam eles oncológicos ou não. É um atendimento a pessoas que precisam de atenção em saúde e estão restritas ao leito de maneira temporária ou definitiva. O serviço presta esses cuidados de prevenção, tratamento e reabilitação"
Luna enfatizou a configuração multidisciplinar do SAD e o seu trabalho com os familiares dos pacientes. “Temos uma equipe com enfermeiros, médicos, técnicos de enfermagem, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, assistente social, psicólogo, nutricionista e terapeuta ocupacional. Trabalhamos junto com a família no sentido de orientar e para a ampliação da autonomia do usuário e do familiar, do cuidador. O enfoque maior é o conforto no lar, para evitar ou substituir a internação hospitalar. Estamos com a família desde o início até o luto. Mesmo após o óbito, permanecemos com a família”.
Ao fim da audiência, foram elaborados alguns encaminhamentos que devem nortear ações de fortalecimento dos cuidados paliativos. São eles: implementação de equipes multidisciplinares de cuidado paliativo nos serviços de saúde; iniciativas de formação contínua com foco na área dos cuidados paliativos; instalação de um serviço específico multiprofissional, hospitalar e ambulatorial, de cuidados paliativos no Hospital do Idoso; sugerir à Secretaria Estadual de Saúde ações de cuidados paliativos no interior de Pernambuco; e apoio público das entidades presentes ao projeto de lei nº 333/2021.
Em 06.10.2021