Frente Parlamentar debate potencial econômico do centro do Recife
A Frente Parlamentar, que é formada por vereadores de nove partidos, recebeu oito especialistas e representantes da sociedade civil para discutir ações que podem incrementar os negócios e fomentar a oferta de postos de trabalho, aquecendo o território central do Recife. Embora todos eles tenham visões específicas sobre a problemática, num apanhado geral do que defenderam, deram ênfase à dinamização econômica do centro, incluindo o turismo cultural e a busca por novos usos para o patrimônio histórico.
“O tema de hoje nos permitiria fazer muitas outras reuniões como essa, dada a complexidade do assunto e o momento em que vivemos, ainda em meio a uma pandemia, com tantos impactos à população e às cidades. Para além de uma pauta local, a crise política e a desestabilização econômica do país reflete diretamente nas possibilidades de realização dos municípios, como é o caso do Recife”, disse a vereadora Cida Pedrosa (PCdoB), presidente da Frente Parlamentar pelo Centro do Recife, na abertura da reunião.
A área de interesse do colegiado compreende o Bairro do Recife (inclusive a comunidade do Pilar, que fica localizada nesse área), a histórica Ilha de Antônio Vaz (que compreende os bairros de Santo Antônio, São José, Cabanga, Joana Bezerra, incluindo o Coque) e a Boa Vista. Participaram da reunião os vereadores Marco Aurélio Filho (PRTB), vice-presidente da Frente Parlamentar; Zé Neto (PROS), Michelle Collins (PP), Luiz Eustáquio (PSB) e Dani Portela (PSOL).
A vereadora Cida Pedrosa considerou que, embora a Constituição de 1988 tenha sido relevante para uma pauta municipalista, diferentemente do que ocorreu com a saúde e a educação, não foi feita uma reforma que permitisse que os próprios municípios tivessem independência nas financias. “Mesmo com o aumento de recursos provenientes das transferências obrigatórias, como o Fundo de Participação dos Municípios, as receitas municipais não são suficientes para produzir condições adequadas de urbanização”, disse.
Os municípios, segundo ela dependem de linhas de crédito junto a bancos públicos ou de transferências voluntárias dos governos estaduais e federal, o que caracteriza uma descentralização sob tutela, pautada por laços políticos, técnicos ou institucionais muito frágeis. “Os programas de financiamento e os recursos do Orçamento Geral da União sofrem descontinuidade nas mudanças de governo ou até mesmo de gestores, dentro de uma mesma gestão. Com isso, as cidades ficam reféns dessas mudanças que, muitas vezes, provocam a paralisação de obras muito importantes para a melhoria da infraestrutura, para a preservação do meio ambiente, para a oferta de novas moradias de interesse social, para a proteção das áreas de riscos, entre muitas outras”.
O vice-presidente da Frente Parlamentar, vereador Marco Aurélio Filho, disse que mais uma vez a Casa de José Mariano traz à tona a necessidade de dinamizar, preservar e democratizar o centro do Recife. “A questão do centro do Recife está sempre em nossas preocupações parlamentares. Já tivemos a oportunidade de falar e de realizar várias reuniões sobre este tema. Ele é algo tão importante que hoje temos uma Frente”, disse.
“O centro reúne condições e qualidades para ser uma potência econômica. Uma potência com vida, como o Recife merece. E esse é o desafio que buscamos. Por isso, pergunto, qual a nossa missão e como podemos resgatar esse centro? Entendo que pressupõe uma união do poder público com a sociedade e a iniciativa privada. Unidos, temos a oportunidade de transformar o Recife. Temos um carinho pelo centro. E estamos diante da alternativa de transformar esse centro. Este é um momento histórico para esta Casa legislativa”, disse Marco Aurélio Filho.
O vereador Zé Neto falou em seguida. Ele considerou que o principal mérito do debate da reunião pública dizia respeito a pensar nos territórios públicos como espaços públicos humanizados. “Sendo assim, acho fundamental definir a palavra dinamizar, a partir da preocupação dos espaços urbanos como organismos humanizados e vivos. De forma mais objetiva, significa revitalizar”. Para o vereador, revitalizar pressupõe a preservação ambiental e pessoas em movimento, promovendo-se a cultura e preservando-se o patrimônio histórico. “Quando falamos do centro do Recife lembramos que muitas intervenções já foram feitas para mudar o uso. A importância de ações realizadas foi indiscutível para que as pessoas pudessem ocupar esses espaços. Mas, fica claro que a revitalização da área e a discussão precisam combater as desigualdades sociais”.
A vereadora Michelle Collins lembrou que a lei municipal número 2/2021, é o Plano Diretor do Recife e que ele define que a região central é um território densamente construído, com elementos do patrimônio, forte incidência de comércio, grande diversidade morfológica e tipológica, e dotada de infraestrutura urbana. “Essa reunião pública, portanto, é de extrema importância, porque a lei precisa ser cumprida na prática. E é para isso que estamos aqui. Os convidados de hoje foram escolhidos a dedo, com muito carinho. Vocês estão aqui porque entendemos a importância dos seus trabalhos e de a Câmara do Recife apoiar este trabalho. Destaco o trabalho do comércio, pois um comércio forte, apoiado pela máquina pública, com amparo legal e com incentivos, é muito importante”, afirmou.
O vereador Luiz Eustáquio afirmou que “o nosso anseio aqui na Câmara Municipal do Recife é de ajudar a nossa cidade e vê-la retomando as suas atividades. Podendo voltar a ser aquela cidade que era pulsante, que tinha um comércio forte. Um comércio que ia desde o varejista, até o informal. O Recife sempre foi assim, pois nasceu a partir do comércio portuário. Hoje, vemos que a nossa cidade está precisando de mais organização no sentido de movimentar a sua economia”. Ele lembrou que a revitalização do centro pressupõe a convivência “harmoniosa” entre pessoas com as diversas vocações do território. “Também precisamos fazer com que a cidade funcione bem, para estimular retomada das empresas”.
A vereadora Dani Portela considerou que a dinamização do centro pressupõe ações em diversos segmentos de interesse. “É no centro que se concentra grande parcela do nosso patrimônio histórico, arquitetônico e cultural. A sua degradação é negativa e impacta em diversos aspectos da vida cotidiana da cidade”. Ela considerou que a Frente Parlamentar está preocupada em debater o chamado centro ampliado e que as palestras da reunião de hoje reunem temas pertinentes aos diversos bairros que compreendem essa região. “Por isso, também quero lançar uma provocação: como funciona o comércio informal na perspectiva do centro? Cabe um comércio informal no centro expandido?”.
O vereador Alcides Cardoso observou que uma alternativa para revitalizar o centro é o estímulo ao empreendedorismo. “Nos últimos anos o empreendedorismo se tornou tema recorrente e pessoas estão abrindo novos negócios. Mas, para se alavancar esse crescimento é preciso que a Prefeitura do Recife promova a desburocratização”. A burocracia, segundo ele, atrapalha o ambiente de negócios e as estratégias de iniciativas inovadoras. “É importante a presença de vocês aqui, pois entendo que esta Frente precisa pensar nas questões de moradia e de comércio”, afirmou.
O primeiro convidado a falar foi o superintendente de Reabilitação Urbana do Porto Digital, Leonardo Guimarães. Ele é arquiteto e urbanista, graduado pela UFPE e graduado em Gestão de Habitats de Inovação. Leonardo Guimarães, que integra a equipe do Porto Digital desde 2000, falou sobre o projeto de modelagem para reabilitação dos centros das cidades brasileiras, coordenado pelo Porto Digital, através de cooperação com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). “O Porto Digital já investiu mais R$ 300 milhões, tem 349 empresas e 13.330 colaboradores. O território impactado é de 171 hectares do centro. Isso pode dinamizar outras empresas como restaurantes, bares e outras empresas na região”, disse.
Já a secretária-executiva de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco, Ana Paula Vilaça, apresentou o Plano de Retomada Econômica de Pernambuco. Ana Paula é arquiteta e urbanista, bacharel em direito e mestra em planejamento urbano. Ela, que já atuou em diversas instituições públicas, é presidenta do Conselho Administrativo do Porto do Recife. “Precisamos ter o nosso centro vivo novamente, pois é grande o seu potencial histórico, cultural, de comércio e serviço”, disse. Ela detalhou o plano que, em sua opinião, pode colaborar na retomada econômica do centro, uma vez que ele visa atrair novos investimentos, gerar mais postos de trabalho e renda e linhas de crédito para pequenos empreendedores, dentre outras medidas.
O comércio informal também foi debatido. A sua dinâmica foi apresentada pela vice-presidente do Sindicato das Trabalhadoras e Trabalhadores do Comércio Informal do Recife (Sintraci), Lu Mendonça. “É importante que o trabalho informal seja debatido nesta Frente. A revitalização do centro é essencial para todos nós, trabalhadores informais, e para a cidade, em especial”. Ela disse também que, como moradora do centro, já presenciou diversos momentos da economia e avaliou como esses momentos impactaram na valorização do centro. Para Lu Mendonça, quando as grandes lojas e magazines migraram para os shoppings, os espaços do centro foram se deteriorando. Lu Mendonça também defendeu incentivo para ocupação de prédios ociosos e de moradia popular. “O centro precisa de reordenamento e reorganização, mas se trata também de diretos humanos”.
O Recife Antigo e seu potencial turístico foi abordado pelo assessor jurídico da Associação Comercial de Pernambuco (ACP), João Guilherme Guerra Cavalcanti. Ele deu enfoque às formas de aproveitar e maximizar essa vocação do bairro. João Guerra trouxe uma série de sugestão que entende serem importantes para dinamizar o centro. “Muitas dessas sugestões já são contempladas em políticas públicas e reiteramos todas, pois entendemos que são importantes. Todas elas são direcionadas para o turismo”. Ele disse que o Recife Antigo precisa ser visto pela ótica do turismo e citou sugestões como a questão do zoneamento, o estímulo à formalização do vendedor ambulante, o controle social, e a melhoria de infarestrutura urbana.
O vice-presidente da Fecomércio, Archimedes Cavalcanti Júnior, falou sobre os desafios impostos para o centro do Recife. “Entendemos a importância do tema, mas sugerimos a existência de um fórum permanente para debater esse tema. É notória a degradação dos centros das grandes cidades brasileiras e o Recife não é diferente”. Entre as diversas sugestões apresentadas, ele citou incentivo para o uso do rio Capibaribe, intervenções permanentes para requalificar o centro, soluções econômicas e investimentos para o empreendedor aplicar em seus imóveis. “Projetos públicos com a parceria da iniciativa privada já funcionou de forma positiva em cidades como São Paulo, no Vale do Anhangabaú”. Qualquer alternativa de revitalização do centro, segundo ele, precisa-se levar em conta a diversidade econômica e social. Ele elogiou a iniciativa da Câmara Municipal do Recife por ter criado a Frente Parlamentar. “Mas, se for criado o fórum ele será mais importante porque é um desafio permanente”.
O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civíl no Estado de Pernambuco (Sinduscon), Avelar de Castro Loureiro Filho, debateu a forma com que o mercado da construção civil está se reposicionando frente à pandemia, mais particularmente com relação à importância de moradias para a dinamização do centro. Ele considerou que não existe território dinâmico sem a presença de moradores. “Nenhum território é dinâmico sem moradores. E o centro do Recife perdeu essa dinamicidade quando afastou os moradores. Ficou sem demanda e sem dinamismo. Nenhuma atividade produtiva vai viabilizar o centro do Recife sem moradia”, disse. O incentivo à moradia, segundo Avelar de Castro, é o primeiro passo. “O centro do Recife vai precisar de um pacto de toda a sociedade, coordenado pelo setor público”.
Como funciona o comércio no contexto do centro? Para responder a essa questão, falou o diretor de Relações Institucionais da Associação de Lojistas do Centro do Recife, Ezequias Bezerra. A Alcere é uma entidade que inclui lojistas dos bairros de São José, de Santo Antônio, da Boa Vista e do Recife. Ele falou da formação histórica do Recife e da importância dos mascates e também disse que a vocação do centro do Recife é o comércio. “O comércio como um todo é um grande pagador de imposto, gerador de empregos, mas sofremos muitos com invasão de calçadas, abandonos de prédios, e não perdemos o foco de nosso DNA, de nossa vocação de mascate. Recife tem a característica de ter uma região de comércio”, disse. Ele reclamou da burocracia de uso de prédios nas zonas especiais de patrimônio histórico, pois não se pode mexer nos prédios históricos. E reclamou da falta de segurança.
Para fechar a Reunião Pública, o secretário de Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação do Recife, Rafael Dubeux apresentou um conjunto de ações que vêm sendo pensadas pela Prefeitura do Recife, englobando o passado e o futuro da cidade. “É um tema que nos preocupa como morador da cidade e como gestor”. Ele disse que o centro é o espaço da cidade que compartilha história e futuro. “Vivemos um período peculiar, pois com a vacinação, nós nos permitimos fazer um debate sobre a cidade que queremos”. Para ele o Recife vive “um novo centro”, pois desde os anos 1990 o Bairro do Recife sofre intervenções, e que há grandes empreendimentos em curso para o centro.
“Atualmente há um conjunto de ações para a gente evoluir”, considerou. E citou como exemplo de inovações o hub de hotelaria para o centro, sobretudo no Bairro do Recife; o bairro da Boa Vista teria recebido incrementos para o pólo de saúde; o pátio criativo, no Pátio de São Pedro está sendo executado; houve, segundo ele, a recuperação do Mercado da Boa Vista e o Pátio de Santa Cruz; há obras de recuperação no Cais da Aurora. “Há um esforço de políticas públicas para melhorar a região. Nossa ideia é ter desafios públicos em vários setores”, afirmou. Ele disse ainda que as parcerias público-privadas têm carteira crescente de projetos. E citou uma lista de numerosos projetos de empreendimentos que dependem de investimentos financeiros. Outra lista de projetos para dotar o centro com melhoria na infraestrutura urbana também foi apresentada.
Após as palestras, os convidados ainda responderam a perguntas dos vereadores. A presidente da Frente Parlamentar, Cida Pedrosa, também divulgou a agenda do colegiado. No dia 25 de outubro haverá uma reunião pública com o tema: “Urbanismo Social no Centro”; em 8 de novembro, uma audiência pública debaterá o tema: “Gestão compartilhada do Centro”. No dia 6 de dezembro haverá o encerramento das atividades da Frente Parlamentar pelo Centro do Recife. “Esperamos até lá, termos um plano de consenso para apresentar à gestão municipal”, disse.
Em 18.10.2021.