Audiência debate os desafios da vacinação na primeira infância no Recife
O vereador Tadeu Calheiros contou que o Programa Nacional de Imunização (PNI) foi formulado em 1973 e atualmente é vinculado à atenção básica de saúde, sendo um dos maiores do mundo e referência na Organização Mundial de Saúde (OMS). "Atualmente, as vacinas ofertadas no SUS (Sistema Único de Saúde) são 48 imunobiológicas distribuídas anualmente pelo PNI".
Ele também falou que o intuito da audiência pública não é apenas fazer críticas à gestão municipal. "O objetivo não é fazer uma simples crítica ao programa no Recife. A gente traz os fatos e mostra que é uma situação que está ocorrendo no Brasil e no mundo, mas nos cabe procurar medidas de melhorias. A OMS e a Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) alertam para um declínio na vacinação durante a pandemia, e vemos que esta queda vem desde 2015, antes da pandemia, que também foi um grande fator na diminuição da vacinação por vários motivos".
O parlamentar pontuou que a desinformação é um dos maiores problemas que acarretam na ausência da imunização. "É ela que mais afasta as pessoas da vacinação, seja por falta de conhecimento ou por fake news que circulam e geram medo. A desinformação é um dos pontos que talvez a gente precise combater e ver medidas para alavancar a vacinação no Recife e em Pernambuco".
Segundo Tadeu Calheiros, em 2019 quase 14 milhões de crianças perderam vacinas vitais, além do Recife estar com 46,6% da cobertura vacinal oferecida pelo SUS em 2021, considerando as 20 vacinas oferecidas.
Médico representante regional da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim), Eduardo Jorge Fonseca, ressaltou que a baixa cobertura vacinal e as fake news sempre acompanharam a sociedade em relação às vacinas. "A gente reforça que de todas as ações básicas de saúde, a vacina só perde para água e saneamento básico. Estima-se que para cada 1 dólar investido em vacinação, a sociedade economiza 20 dólares, e nem uma outra ação em saúde é tão custo-efetiva. A queda da vacina vem antes da pandemia, desde 2015 para cá, agravada nos últimos dois anos, o que nos deixa muito preocupados porque, para todas as vacinas do Brasil, o percentual está em torno de 50 a 60% de cobertura".
Ele alertou para a possibilidade de um surto de sarampo por conta da evasão vacinal. "A perspectiva é que em 2022 possamos ter um surto de sarampo muito real e factível se a gente não tomar algumas medidas fundamentais. As pessoas acham que as doenças desapareceram e os pais se preocupam demais com reação adversa e a febre baixa do pós-vacina. A dor da picada passa a ter uma proporção muito maior do que a preocupação com a cobertura vacinal e as fake news, que vem tomando proporção grande no mundo inteiro", afirmou.
Promotor e coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça em Defesa da Saúde (Caop Saúde) do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), Édipo Soares, disse que o baixo índice de vacinação teve reflexo no Ministério Público. "Esse fato provocou para nós uma movimentação e realização de vários procedimentos de recomendação de gestores no sentido de que pudesse haver busca ativa e um trabalho mais massivo. O objetivo é que a gente pudesse recuperar nos municípios o que a gente perdeu, tendo em vista a perda do certificado contra o sarampo. O afastamento das pessoas dos novos imunizantes pode ser por uma certa desconfiança, pelo curto tempo de desenvolvimento, que precisa ser esclarecido".
Édipo Soares comentou acreditar que a baixa escolaridade no Brasil eleva o nível de dificuldade. "Em recentes reuniões, inclusive na Comissão Intergestora Bipartite, tivemos conhecimento da baixa cobertura até para covid-19 e, na condição de exercer uma função de confiança do procurador-geral de Justiça, sugeri que pudesse fazer uma recomendação promovendo uma série de medidas para que essa cobertura pudesse ser melhorada e aproveitei a questão da covid e inclui todos os outros imunizantes que fazem parte do calendário obrigatório. Dentre essas medidas, posso destacar a busca ativa, divulgação da importância da vacinação, responsabilidade coletiva, reforço das equipes responsáveis pela vacinação nos postos e salas".
O promotor lembrou o caos e o desespero da população para se vacinar assim que a vacina contra covid-19 surgiu e foi liberada. "Começamos a pandemia apurando casos de pessoas furando as filas, hoje estamos precisando pegar essas pessoas no seu local ou ir até elas para se vacinarem. É uma realidade bem dinâmica e diferente do começo da pandemia. É uma discussão muito pertinente que a Câmara dos Vereadores traz ao Executivo para a gente repensar no remanejamento desses recursos que realmente não são pequenos", pontuou.
Por sua vez, a médica e presidente da Sociedade de Pediatria de Pernambuco (Sopepe), Kátia Brandt, enalteceu a necessidade de entender os motivos que fazem os familiares não levarem os filhos para se vacinar. "Falando em nome da pediatria, até que ponto está havendo uma omissão ou falta de espaço na consulta pediátrica para que essas orientações e valorização sejam feitas?", questionou. "Nada do que é imposto é sustentável, acho até que tende a ter efeito contrário. O caminho é o entendimento de que as famílias desejam compreender essa proteção aos filhos e se sentirem seguras. É muito desagradável obrigar uma família a fazer um medicamento, procedimento ou tomar uma vacina sem que ela se sinta segura".
A presidente da Sopepe lamentou as notícias falsas e que descredibilizaram a ciência. "Infelizmente, a gente teve uma perda na credibilidade da medicina e da saúde em função de todas essas divergentes posições que ocorreram durante a pandemia. Vamos ter um pouco mais de trabalho pela frente para construir de novo esse caminho educativo. A gente precisa formar mais médicos promotores de saúde e que tenham interesse em se envolver e atuar promovendo a saúde, não apenas prescrevendo remédio e orientando medicação. É um caminho educativo e precisa se pensar também em ações. Acho que nenhuma ação isolada vai ter sucesso. Se a gente tem uma campanha de marketing e não é acompanhada por um discurso dos médicos que as pessoas confiam, não se surte o efeito esperado".
Já a enfermeira e coordenadora municipal de Imunização do Recife, Elizabeth Azoubel, que trabalha no PNI desde 1980, afirmou que, naquela década, em um só dia, era atingida a meta de 90% das campanhas de vacinação contra a poliomelite. Ela apontou alguns motivos que levaram à evasão da imunização. "A gente atingia praticamente a meta de todas as vacinas. Mas, começou a cair em 2016, e em 2020 e 2021 as coberturas despencaram. Quais seriam os aspectos relacionados a essa queda? Uma grande causa pode ser o êxito do PNI que causa a falsa sensação de que a doença não existe mais e as vacinas não são mais necessárias; alguns irresponsáveis acreditam que a imunidade provocada pela vacina é menos eficaz que a da doença, preferindo enfrentar o risco de doença e não da imunização. Outra causa são as fake news e os grupos anti-vacina crescendo nas redes sociais".
Elizabeth Azoubel também sugeriu algumas ações solucionadoras para a grande evasão vacinal que, inclusive, o PNI vem tomando na cidade. "Para melhorar essa cobertura, a gente tem tentado fazer a vacina itinerante nas áreas descobertas. O grande sonho do PNI é que a gente tivesse um vacimóvel, que seria um carro equipado para fazermos as ações nas comunidades. Além disso, tem o treinamento dos agentes comunitários de saúde com atualização do calendário de vacinação para realizarem a busca ativa dos usuários em atraso. Na campanha da influenza a gente fez uma parceria com o Sesi para fazer uma vacinação itinerante, e também com o Procon. Fazemos também a vacinação em creches e escolas públicas e privadas", contou.
Presente na audiência, o vereador Alcides Cardoso (DEM) parabenizou Tadeu Calheiros pela iniciativa e os participantes pelo debate e sugestões. "Quero parabenizar a todos e dizer que podem contar com o nosso mandato para o que for preciso".
Encaminhamentos - Na audiência pública desta segunda-feira (6), o vereador Tadeu Calheiros (Podemos) fez alguns encaminhamentos como resultados das sugestões abordadas no debate. "A primeira medida é fazer o requerimento criando a Semana da Vacinação nas escolas públicas e privadas que deve acontecer semestralmente. O segundo ponto é a vacinação itinerante do PNI, que seria um consultório móvel; além do aumento do número de profissionais nas salas de vacinação; aumento de campanhas informativas e a obrigatoriedade da distribuição de um material informativo para os pais no ato da matrícula nas creches e escolas. Por fim, seria a abertura dos postos de vacinação aos sábados, pela dificuldade que muita gente tem de ir durante a semana", disse.
Em 06.12.2021