Audiência pública questiona Prefeitura sobre sistema viário da obra da ponte Monteiro-Iputinga

A Câmara Municipal realizou nesta terça-feira (5), de forma híbrida, mais uma audiência pública sobre a obra da ponte Monteiro-Iputinga, aguardada pelos recifenses desde 2012. O evento foi requerido pelo vereador Alcides Cardoso (PSDB), que já debateu o tema em duas outras ocasiões, desde setembro de 2021. Desta vez, a discussão girou em torno do sistema viário da obra.

“Na primeira audiência que promovi, no dia 30 de setembro do ano passado, a Prefeitura do Recife admitiu que retomou os serviços no canteiro de obras sem termos concluído o projeto viário”, lembrou Cardoso. “São muitas dúvidas que permanecem sem respostas sobre uma obra importante, que irá desafogar o trânsito de nossa cidade”.

Ao dar início à audiência, o vereador fez uma retrospectiva da obra – do primeiro contrato, firmado em 2012, ao projeto de sistema viário contratado em 2019, cujo quinto e último aditivo foi liquidado em março deste ano, a um custo de R$ 309,2 mil.

Em sua apresentação, Alcides Cardoso recordou a trajetória de atrasos e erros que marcaram a obra. Iniciada em 2012, a um custo de R$ 43 milhões, e suspensa em 2014, a construção foi alvo de questionamentos do Ministério Público Federal (MPF) e do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que apontaram em 2016 um desequilíbrio entre o dinheiro público gasto e aquilo que foi efetivamente realizado. Segundo o parlamentar, em 2018 o TCE apontou que falhas no projeto da ponte já representavam um prejuízo de R$ 10,4 milhões.

O novo contrato da obra veio apenas em 2020, a um custo de R$ 27,5 milhões. “Porém, tal instrumento não contemplou as cabeceiras e nem, muito menos, os acessos viários. Ou seja, não tem subida e nem descida, só um arco. Também não se sabe como ficará a necessária conexão viária para se acessar as avenidas 17 de agosto, de um lado, e Maurício de Nassau, de outro”, afirmou Alcides Cardoso.

De acordo com o parlamentar, os erros cometidos anteriormente pela administração persistem. “Passados mais de 25% do tempo contratual previsto, apenas R$ 3,3 milhões foram liquidados, o que representa somente 12% da execução da obra. Isto é, as falhas constatadas no passado, principalmente os atrasos, continuam sendo verificadas nos dias atuais”.

Na audiência, foram levantados, ainda, questionamentos sobre a falta de diálogo e transparência com os moradores das cerca de 50 residências da Zona Especial de Interesse Social (ZEIS) Vila Esperança/Cabocó que serão desapropriadas. O tema foi frisado pelo vereador Ivan Moraes (PSOL), que também participou do evento.

“Nenhuma intervenção pública pode ser feita sem se observar a segurança, conforto e bem estar das pessoas que habitam aquele lugar. A Prefeitura não escolheu um terreno vazio para fazer a obra. E nem é uma comunidade qualquer, mas uma Zona Especial de Interesse Social, protegida pela lei. Os relatos que chegam da forma como está sendo feito essa negociação não compactua com os princípios das ZEIS, que é zelar pela permanência das pessoas naqueles lugares”, defendeu Moraes. “Estamos falando de 50 famílias e de um projeto de muitos milhões, mas em que a contrapartida para essas famílias é irrisória. É importante, também, que se diga que muitas das residências estão sendo desocupadas por conta de um projeto viário que não existe”.

Projeto urbanístico - O secretário de Infraestrutura do Recife, Daniel Saboya, falou logo em seguida ao vereador Ivan Moraes. Ele disse que, assim como os parlamentares, a Prefeitura do Recife também “quer uma ponte que ajude a melhorar o trânsito e que o processo de negociação e de desapropriação seja pacífico”. Afirmou esperar que os moradores da área, a Vila Esperança/Cabocó, venham a ser contempladas com “algo justo, com a garantia de moradias na comunidade ou em outros locais”.  Saboya avisou que aproveitaria a audiência pública para apresentar o projeto urbanístico e geométrico do Complexo Viário. “O projeto urbanístico está com 80% do previsto realizado”, afirmou. Ele explicou que o projeto viário é uma etapa posterior e que depende desses projetos urbanístico e geométrico.

Os dois projetos foram apresentados pelas gerentes da Autarquia de Urbanização (URB), Luana Gentili e outra que foi identificada apenas como Damaris. Elas explicaram que o projeto urbanístico contempla as obras de melhoria da região e o geométrico é o traçado das vias que permitirá a implantação do complexo viário. Damaris iniciou contextualizando a localização da ponte. “Ela ficará próximo ao Casarão do Barbalho, na Iputinga, e ao Parque do Caiara, no local próximo ao Carrefour. Será uma nova opção de rota para o deslocamento para Casa Forte e Iputinga”, disse. De acordo com a gerente Damaris, o sistema viário é composto por vias de apoio e haverá ligações de diversas ruas para viabilziar o sistema viário. Ela explicou que haverá novas vias, interseções para permitir a mobilidade na ponte, a implantação de cinco quilômetros de ciclovias e ciclofaixas, construção de um parque linear, áreas de convivências em ruas e requalificação de área verde e de lazer no entorno da ponte.

Com o apoio de slides a gerente mostrou algumas maquetes eletrônicas que ilustram como a ponte ficará e também quais são as características do projeto. Garantiu que haverá a requalificação das ruas próximas à ponte, inclusive uma delas totalmente projetada, e fez referência a cada uma delas, além de soluções que serão dadas ao transporte coletivo em avenidas na região. Vários equipamentos de lazer serão instalados nas duas margens do rio. “O projeto pensou a relação do projeto com a área de convivência com o rio. Há, por exemplo, uma área de piquenique”, disse. Ela acrescentou que, no projeto urbanístico, foi privilegiado o transporte ativo e dado prioridade à acessibilidade.

Após ouvir o projeto urbanístico, a representante da comunidade, Jeane Dantas lamentou que o projeto do sistema viário está sendo realizado sem a comunidade da Vila Esperança/Cabocó ser ouvida. Ela afirmou que é morada da Vila Esperança/Cabocó há 19 anos e a área Zeis foi constituída desde 1994, mas “nem a Prefeitura do Recife e nem o Prezeis regularizaram a propriedade. Foi por negligência dessas entidades o fato de que nós até agora não tenhamos recebido o título”, disse. Ela informou que meses atrás, a Prefeitura e o Prezeis chegaram à comunidade, marcaram algumas casas sem comunicar o motivo ou o projeto da Ponte. “Ate agora não conhecemos nada desse projeto e estamos solicitando informações”.

A ex-secretária de Infraestrutura do Recife, no governo de Roberto Magalhães, Celecina Pontual, que é funcionária do gabinete do vereador Alcides Cardoso, pediu explicações sobre o projeto executivo do sistema viário da região. “Esta audiência foi feita para ser apresentado o projeto viário executivo e não o urbanístico.  Nós queremos saber como ficará o sistema viário. Todos sabem que aquele trecho, do jeito que se encontra, é intransitável”. Ela afirmou que o projeto executivo deveria constar com explicações sobre dados atuais de trânsito, quantos carros circulam, quantos vêm da BR-101 para o centro, quantos saem da Avenida 17 de Agosto para a Iputinga e vice-versa”. Pontual também pediu um estudo que mostre como o projeto viário vai impactar nos moradores da região.

O ex-presidente da URB, Jaime Prado, disse que “urbanisticamente a obra está de parabéns, afinal teremos mais um parque à beira do Rio Capibaribe, com locais para pets e carros. Mas a questão viária é a função desta audiência. As explicações precisam ser dadas no setor viário, pois a própria geometria do local dificulta o acesso das duas áreas onde a ponte ficará instalada”, cobrou.

Encaminhamentos - O vereador Alcides Cardoso voltou a falar e fez alguns questionamentos. Disse que o projeto urbanístico apresentado parece “contemplar principalmente os prédios espigões que estão sendo construídos pela Moura Dubeux na região” onde a ponte será instalada e cobrou à Prefeitura do Recife uma maior escuta junto à população para saber o que o povo espera da ponte.

A representante da Autarquia de Trânsito e Transportes Urbanos (CTTU), Kelly Pereira, explicou que o projeto viário executivo já existia, mas que ele terminou sendo rejeitado pelos técnicos da URB. Segundo disse, esse mesmo projeto foi readequado, tomando-se “todos os cuidados para com a comunidade” e que nessa readequação “foi visto  que havia a necessidade de outro tratamento, que é este que está sendo dado”. Kelly Pereira afirmou que os pontos de adequação vão reduzir os impactos e o projeto viário vai permitir melhorias no trânsito da região, pois “um projeto desse nível pode dar contribuições importantes para a cidade”. Kelly Pereira também ressaltou que além das melhorias incluídas nos projetos urbanístico e geomérico, “a CTTU também vai fazer outras melhorias de trânsito na redondeza para melhorar o uso e futuro da ponte”.

Antes de a audiência pública terminar, o secretário Daniel Saboya explicou que o projeto de construção da ponte não é da gestão atual. Ele existe há vários anos e que “cabe ao atual prefeito apenas executar o viário”. Ele acrescentou estar consciente de que a obra causa transtorno, mas que antes de o elevado ser construído haverá negociação com os moradores para resolver a questão da moradia. “Queremos deixar claro que o projeto agora é urbanístico e depois é que o pessoal de engenharia vai readequar as peças, fazer terraplenagem, rede elétrica, iluminação pública. Tudo será feito após o projeto urbanístico e o traçado. Só poderemos ir para a comunidade quando tivermos o projeto urbanístico 100% concluído. Além disso, 26 famílias residentes na comunidade já aceitaram a negociação de moradia e outras 27 estarão em negociação. Nenhuma das famílias, até aqui, quis ir para habitacional”.

Nos encaminhamentos, o vereador Alcides Cardoso disse que é fundamental que a Prefeitura do Recife apresente, no prazo de 15 dias, a previsão de conclusão das obras uma vez que o prazo inicial seria o dia 30 de março deste ano. “É preciso que explique também o descompasso do tempo de previsão e o de construção. Também queremos o detalhamento da construção, planejamento de quantos imóveis serão desapropriados para implantação do viário, e os valores envolvidos na obra”, disse.

Em 05.04.2022