Audiência aborda lei sobre dispositivos de segurança em instituições financeiras

Vigilantes com coletes balísticos e armados, portas de segurança com detector de metais, guarda-volumes gratuito para clientes e visitantes. Essas são algumas das exigências previstas pela lei municipal nº 18.634/2019, sobre os dispositivos de segurança obrigatórios das instituições financeiras e similares localizadas no Recife, cujo cumprimento foi alvo de uma audiência pública promovida pela Câmara Municipal nesta quinta-feira (19). A iniciativa do debate partiu da vereadora Liana Cirne (PT).

De acordo com a parlamentar, algumas unidades do banco Bradesco localizadas no Recife não cumprem os requisitos da lei. No entanto, segundo representantes da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e do Bradesco presentes na audiência, essas agências estão sendo adaptadas para funcionar como “unidades de negócios”, que não oferecem todos os serviços das agências bancárias e não precisariam seguir as exigências da lei nº 18.634/2019.

A diferença, diz a Febraban, é que nas unidades de negócios não existe movimentação de numerário – isto é, dinheiro em espécie – de terceiros, informação contestada pela categoria dos bancários, que propôs ao gabinete de Liana Cirne a realização da audiência.

Ao dar início ao debate, a vereadora afirmou que a lei, de autoria do vereador Samuel Salazar (MDB), marca uma história de luta da categoria por mais segurança nas instituições financeiras pernambucanas. “Pernambuco foi pioneiro na legislação de segurança bancária e protagonista nacional na luta pela ampliação nacional dessa segurança. Era um dos estados em que havia maior violência, com um histórico terrível de utilização de explosivos furtados das forças armadas e da Polícia Militar. Havia sequestros-relâmpago de consumidores, de bancários e, inclusive, de familiares de bancários. A lei que foi aprovada no Recife serviu de parâmetro para vários outros municípios”.

Samuel Salazar explicou que a lei foi produzida a partir da preocupação com a vida de trabalhadores como os vigilantes das instituições bancárias. Ele lembrou que a norma surgiu para aproveitar os avanços nos recursos tecnológicos de segurança e, além disso, contextualizou a discussão desta quinta-feira em torno das novidades representadas pelas unidades de negócios. “Estamos aqui para preservar a vida das pessoas. O nosso propósito era modernizar a legislação. Hoje, a discussão é sobre o que seria a unidade de negócios e uma instituição financeira onde há movimentação”.

De acordo com o assistente técnico do consumidor Lucas Bandeira de Mello, do Programa de Proteção e Defesa do Consumidor do Recife (Procon Recife), a instituição promoveu fiscalizações a 17 agências bancárias nesta semana, após ser acionada pelo gabinete de Liana Cirne. "À primeira vista, estava tudo certo no que diz respeito à legislação municipal nessas agências específicas. Gostaríamos de nos colocar à disposição tanto do gabinete da vereadora, quanto a todos os bancários. Somos todos consumidores. Qualquer cidadão pode acionar o Procon e vamos verificar se, de fato, a lei está sendo cumprida”.

O assessor de relações trabalhistas e sindicais da Febraban, Heliomar Santos, disse que a entidade considera adequadas as legislações federal e municipal sobre a segurança em agências bancárias, mas que elas não atingem as unidades de negócio. “As duas falam expressamente em agências ou postos de atendimento em que haja movimentação ou guarda de numerário. Não é o que acontece nas unidades de negócios. Quem diz isso é a Polícia Federal, que é quem tem competência para fazer esse tipo de análise. Na visão dos bancos, estamos fazendo uma readequação, mantendo o atendimento presencial, preservando postos de atendimento bancário e, principalmente, dando para esses trabalhadores as mesmas condições de trabalhadores de outros setores que atuam como agentes autônomos de investimento, como corretores de seguro”.

O presidente do Sindicato dos Bancários, Fabiano Moura, argumentou que a transformação de agências bancárias em unidades de negócios reduz a função de prestação de serviços à população em geral que deve nortear os bancos. Ele também defendeu que a justificativa sobre a inexistência de movimentação de numerário nessas unidades não se sustenta. “O Bradesco está transformando algumas das agências tradicionais em unidades de negócios, alegando que não há numerário nelas. Nós discordamos: há movimentação financeira dentro dessas agências e agências e há numerário no autoatendimento nessas agências. Não aceitamos que o banco retire os itens de segurança. Imagine estar numa agência dessas fazendo negócios, ou trabalhando o dia inteiro, sem vigilante e sem porta com detector de metal. Isso vai expor muito a vida dos bancários e dos clientes”.

A Febraban e o Bradesco também foram representadas pelo diretor setorial do comitê de segurança bancária das duas instituições, Pedro Viotto. Ele afirmou que as mudanças ocorridas nas unidades seguem as transformações tecnológicas dos últimos anos e que as unidades de negócios possuem objetivos diferentes das agências bancários – a permanência dos caixas eletrônicos nesses locais servem apenas para a comodidade dos usuários. Ele afirmou, ainda, que o sistema bancário atuou para reduzir em 98% nos ataques a banco nos últimos 21 anos. “Teve uma aceleração muito grande em relação à pandemia. Evoluímos dez anos em apenas um, dois anos”, disse. “O Procon fiscalizou 10% das agências do Recife e não encontrou descumprimento à lei municipal. Em todas as agências onde temos o saque e o pagamento na boca do caixa, a guarda e a movimentação de numerário pelo bancário, a lei vem sendo cumprida rigorosamente”.

De acordo com a secretária de assuntos jurídicos da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Instituições Financeiras do Nordeste (Fetrafi/NE), Suzineide Rodrigues, indicou que as mudanças promovidas põem em risco a segurança de bancários e clientes, mesmo que as unidades de negócios não ofereçam todas as operações das agências tradicionais. “Não estamos tratando apenas de guardar numerário. Estamos falando das pessoas que vão ao banco fazer uma operação e que elas correm risco de vida. O cliente corre de risco quando vai ao banco que não tem segurança. Outros bancos adotam esse modelo de unidade de negócios, mas, diferente do Bradesco, mantiveram a porta eletrônica e os vigilantes. Não é o modelo, mas o que o banco está fazendo para economizar”.

O presidente da Confederação Nacional dos Vigilantes, José Boaventura, relatou a sensação de insegurança que as mudanças levaram à cidade de Salvador (BA), onde, segundo ele, as unidades de negócios têm substituído agências bancárias. “Lá em Salvador, onde não tem a lei municipal, os bancos já implementaram a unidade de negócios. Tiram a porta eletrônica. Tem a agência e os caixas eletrônicos do lado de fora. E o bancário está, todo os dias, na fila orientando as pessoas a fazerem os seus saques. Aqui em Pernambuco, os servidores públicos recebem pelo Bradesco. E vão para a fila sacar dinheiro. Se um morrer, é uma desumanidade”.

Após as considerações da mesa, a audiência pública abriu espaço para o público presente. Ao final do debate, Liana Cirne compreendeu o evento como um sucesso do ponto de vista da escuta de bancários e vigilantes, mas lamentou que a representação dos bancos não tenha modificado sua posição de retirar itens de segurança das agências que se tornarão unidades de negócios. “Infelizmente, a Febraban já se posicionou contrariamente ao pleito, que é o de manter todos os equipamentos de segurança nas agências de negócios. Entendemos que a retirada de equipamentos de segurança expõe demais os consumidores em geral. Volta o aumento daquele tipo de assalto que se dá fora do estabelecimento e torna vulnerável o próprio estabelecimento. Não queremos retroceder ao tempo em que estabelecimentos financeiros eram extremamente perigosos”.

Em 19.05.2022