Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes é debatido na Câmara do Recife

A vereadora Michele Collins (PP) promoveu, na manhã desta quarta-feira (18), uma reunião pública, no plenarinho, com a finalidade de debater sobre o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. “A data escolhida foi 18 de maio, conforme estabelece a Lei Federal nº 9.970, em razão do crime ocorrido em 1973, conhecido como o Caso Araceli, em que uma menina de oito anos de idade foi brutamente assassinada depois de ter sido violentada em Vitória, no Espírito Santo”, explicou a parlamentar.

Michele Collins lamentou que violências estejam ocorrendo com crianças e que são causadas por pessoas próximas às vítimas. “Quando encontramos crianças de zero até quatro anos violentadas, nós precisamos trabalhar e muito porque é uma perversão do caráter humano. É preciso acabar com isso. Muitas vezes parentes têm livre acesso e isso torna mais difícil denunciar”. A parlamentar citou legislações pertinentes em vigor, dentre elas o Decreto 10701 /2021 que Institui o Programa Nacional de Enfrentamento da Violência contra Crianças e Adolescentes e a Comissão Intersetorial de Enfrentamento à Violência contra Crianças e Adolescentes. “O Programa visa a articular, consolidar e desenvolver políticas públicas voltadas para a garantia dos direitos humanos da criança e do adolescente, a fim de protegê-los de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, abuso, crueldade e opressão”.

A vereadora também lamentou que só existam apenas quatro delegacias especializadas em atuação na defesa das crianças e adolescentes. “Sendo duas no Recife, uma em Paulista e outra em Jaboatão dos Guararapes, é muito pouco. Compreendemos que o melhor caminho para combater a violência sexual contra crianças e adolescentes também passa pela prevenção, e é preciso que existam ações de cunho informativo junto a familiares e responsáveis, além da capacitação de profissionais que atuam na educação e assistência social, com a identificação de crianças e adolescentes em situação de risco, do acompanhamento das vítimas e do agressor. É um desafio para todos nós”.

O secretário geral da OAB/PE, Guilherme Veras, comentou os números obtidos pelo canal de denúncias Disque 100. “Em 2020, foram registradas cerca de 24 mil denúncias de violência sexual, e esse número aumenta mais ainda quando a gente fala das notificações feitas do Sistema de Saúde, mais de 20 mil casos em nosso país. Mesmo sendo esse número gigantesco, esse número é muito maior”.

Guilherme Veras disse que a OAB se compromete a continuar trabalhando para defender os direitos das crianças e adolescentes da cidade, estado e país e que um trabalho deveria ser executado junto aos advogados e advogadas. “Sentimos ainda uma necessidade, enquanto Comissão em Defesa dos Direitos das Crianças e Adolescentes da OAB/PE, de haver uma capacitação muito forte por parte do trabalho dos advogados. Apesar de existir um Centro Integrado de Criança e Adolescente feito pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco, a questão dos Direitos Humanos é muito pouco difundida no mundo jurídico, o que é um objetivo da nossa Comissão de trazer essas informações e trabalhar cada vem mais, com os advogados e advogadas, para que possa ser defendido o Direito da Criança e Adolescente. É importante denunciar no Disque 100 e em outros canais disponibilizados”.

Augusto Lepre de Souza, Oficial da área de Proteção do UNICEF, recordou que a data 18 de Maio merece reunir forças, pois trata-se de um tema duro, complexo e, infelizmente, global. Ele lamentou que os dados obtidos no país são discrepantes e que existe um problema entre os números de Boletins de Ocorrência e no Sistema de Saúde. “Na maioria dos países temos números preocupantes. O UNICEF fez um trabalho com o Fórum de Segurança Pública analisando de forma desagregada, para os dados de estupro. Temos um problema histórico no Brasil de sistema de informações e dados que sejam confiáveis para que a gente possa avaliar e monitorar as violências sexuais contra crianças e adolescentes. A gente precisa trabalhar na prevenção e as escolas têm um papel fundamental, assim como todas as igrejas”.

Romero José da Silva, presidente do Conselho Municipal de Defesa e Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente (COMDICA), ressaltou que o COMDICA é corresponsável pela garantia dos Direitos da Criança e Adolescente. “Temos a responsabilidade com a garantia dos Direitos Humanos e não entender isso é ser contrário ao Estatuto [da Criança e do Adolescente]. É necessário um conjunto articulado de ações para efetivação dos direitos. A não articulação tem um prejuízo e acaba sendo um campo fértil para que as violações aconteçam o tempo todo. No Recife, a delegacia atende até 18h, nem feriado, nem final de semana. É preciso que essa política pública esteja disponível em tempo integral”.

O diretor da Rede Esperança, Tobias Scher, falou sobre a perspectiva de uma criança diante da violência sofrida. “Para uma criança que sofreu abuso, o mundo quebrou. Ela era antes uma criança e hoje, não mais. Elas querem ser felizes, querem brincar. Trabalhamos na comunidade de Santo Amaro, com o Programa Levante, e o problema que encontramos é que os pais que abusaram também foram abusados no passado. Essas famílias precisam de educação. É educar mães e pais e fazer entender que o que eles fazem é crime e não é normal. É uma educação a longo prazo e precisa ser feita no dia a dia”.

Representando a Prefeitura, a gerente da Criança e Adolescente da Secretaria de Desenvolvimento Social, Direitos Humanos, Juventude e Políticas de Drogas, Dayse Albuquerque, disse que uma das temáticas da pasta é a prevenção, autocuidado, proteção e desde cedo ensinar como se proteger. “A escuta qualificada é muito importante porque se sentir acolhido dá mais coragem em denunciar. Outro ponto crucial é a democratização da informação. Explicar de uma forma que todos e todas possam entender. Temos acesso a um número muito grande de informações, mas que tipo de informação está sendo exibido? É preciso desbravar os territórios e compreender realidades locais”.

O representante da organização Visão Mundial, Carlos Bruno, ressaltou que a violência sexual se dá pelas relações de poder e enalteceu o papel fundamental da escola. “Nas relações de poder, alguém se enxerga como dono e acha que o outro corpo é propriedade. Percebemos a normalização da violência no momento quando dizem que briga de marido e mulher não se mete a colher. Temos um trabalho na RPA3 e a gente vê que muito da comercialização dos corpos se desenvolve por vários outros fatores e violências sociais que existem. As pessoas voltaram a ter fome e isso desencadeia outras violências. A escola precisa ser um espaço seguro para a criança, que traga a voz da criança e do adolescente para o debate e a reflexão. É um espaço que precisa ser fortificado para as notificações, justamente para que não haja as subnotificações. Como a igreja e outros locais, a escola tem um papel fundamental e fortalece os processos porque muito do testemunho espontâneo acontece na escola”.

Após os debates, a vereadora Michele Collins citou encaminhamentos: Elaboração de documento que será enviado ao Governo de Pernambuco sobre a ampliação das delegacias e dos horários de atendimento; solicitação de levantamento à Prefeitura sobre os números de quantas crianças e adolescentes são abusadas no Recife e informações sobre orçamento destinado.

Em 18.05.2022