Ana Lúcia debate a ressocialização de meninas e mulheres encarceradas

Para discutir e buscar soluções e encaminhamentos sobre “a ressocialização de meninas e mulheres encarceradas”, a vereadora Ana Lúcia (Republicanos) reuniu autoridades, pessoas que trabalham com essa temática e reeducandas do sistema prisional para uma reunião pública na Câmara Municipal do Recife, na tarde desta quinta-feira (10). A parlamentar levou em conta que existem cerca de 34 mil mulheres brasileiras atrás das grades, de acordo com o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen Mulheres), lançado pelo Ministério da Justiça e que esse número não para de crescer.

De acordo com informações disponibilizadas pela vereadora, uma parte dessas mulheres são mães que estão longe dos seus filhos e dos seus lares. Teriam sido presas por diversos motivos, sendo que mais da metade delas foi por envolvimento com o comércio de drogas. Ainda de acordo com as informações disponibilizadas pelo gabinete da vereadora, em geral são mulheres jovens, solteiras, não brancas, com baixa escolaridade, que na prisão estão expostas não só à pena de reclusão, abarcando castigos corporais, ambientais, insalubres, exposição às drogas, contágio de várias doenças e abandono familiar.

Os dados que serviram para embasar a reunião pública deram conta de que as dificuldades vividas antes do cárcere foram categorizadas como abandono parental, trabalho precoce, abuso sexual, relacionamentos abusivos e aliciamento ao crime por figuras masculinas. Durante o cárcere, dizem os dados, as dificuldades apresentadas foram solidão, e estratégias de resistência. Depois da prisão, os problemas foram classificados em saúde comprometida e dificuldade financeira ou de inserção no mercado de trabalho. A penalização adicional no cárcere é exclusão do mercado de trabalho depois da prisão.

Somar - De acordo com a vereadora Ana Lucia, o tema da ressocialização de mulheres egressas do sistema penitenciário é um problema que “a sociedade precisa se preocupar, pois essa não deve ser uma tarefa só do sistema judiciário e da justiça. Enquanto mais suporte, apoios e braços, melhor”. De acordo com a parlamentar, a vida das mulheres que estão aprisionadas é muito difícil dentro do universo dos presídios. “Mas, para elas, estar fora dos encarceramentos também é um grande problema”, diante dos preconceitos. Ana Lúcia acrescentou que sua preocupação é saber o que a Câmara Municipal, enquanto Casa Legislativa, junto com outros órgãos e instituições, podem somar para que as mulheres tenham aparato do poder público que possibilite a ressocialização.

A primeira a falar foi a fundadora do Instituto Responsa, Karine Vieira, que é egressa do sistema prisional. Ela lembrou que o Brasil é o terceiro país que mais encarcera mulheres, pois teve uma alta de mais de 62%. “O que me levou ao crime foram questões familiares”, contou. Ela disse que teve advogado particular, foi absolvida, mas reconheceu o empenho da Defensoria Pública, que faz “um bom trabalho, mas não dá conta de atender a tantos processos”. Karine Vieira disse que quando foi absolvida, criou o Instituto Responsa, fundado em 2018. Ele já atendeu a cerca de 2 mil pessoas e seu objetivo é auxiliar as mulheres no processo de ressocializar e fazer a reintegração social. “Menos de 5% das pessoas que atendemos, reincidiram”.

Preconceito - Uma outra reeducanda, Regina Coeli, disse que enfrentar o preconceito da sociedade depois que as mulheres saem do sistema carcerário é tão difícil quanto o cumprimento da pena. A integrante do Grupo UNP, identificada como Valéria, falou de sua experiência dentro e fora do sistema carcerário. “Fui do Bom Pastor. Muitas pessoas, quando chegam no presídio, são abandonadas pela família. Eu fui uma delas. Minha avó é que me levou conforto espiritual e familiar”. Dentro do Bom Pastor ela viveu experiências fortes e, quando saiu, carregou por muitos anos o carimbo de ex-presidiária. Hoje, ela faz parte de um grupo religioso que vai evangelizar nos presídios. “Eu venci”.

O secretário-executivo municipal do Trabalho e Qualificação Profissional, Pedro Montenegro, fez explanação dos serviços da Secretaria e se colocou à disposição para atender às mulheres em processo de ressocialização. A representante da Secretaria da Mulher, Janaina Granja, disse que as reeducandas só conseguem melhorar de vida se tiverem garantida a independência financeira. “Do ponto de vista do poder público, essa temática precisa ser tratada através de vários olhares. O poder público precisa se juntar em todas suas esferas para criar perspectivas para essas mulheres”.

Na sequência, falou a representante do Casem Santa Luzia (da Funase), Catarina Paiva. O Casem é uma unidade que recebe jovens mulheres e transgêneros, que já estão sentenciadas e prontas para ressocialização. Segundo Catarina Paiva, as reeducandas saem de lá com matrícula em escola, e têm um processo educacional continuado. Elas frequentam cursos profissionalizantes e o Casem faz parcerias de estágios com instituições que lhes garantem oportunidade de aprendizado e emprego.

A desembargadora do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Daisy Andrade, falou das dificuldades de ressocialização e das iniciativas do Poder Judiciário. Ela disse que a Coordenadoria da Mulher, do TJPE, já trabalhava no enfrentamento da violência contra a mulheres quando ampliou o olhar para as que estão encarceradas. Também falou do Grupo de Monitoramento e Fiscalização das Penas e das estratégias para contemplar as políticas para a mulher encarcerada. “Nós criamos uma cartilha dentro do Projeto Recomeçar, na coordenadoria da Mulher”, que explica direitos e deveres das mulheres encarceradas. A cartilha orienta as mulheres e os familiares.

A psicóloga socioemocional, Sonicleia Santos, disse que, ao serem aprisionadas, as pessoas perdem a individualidade e a identidade. “Elas são tratadas como número, de acordo com instituição. O espaço da psicologia é ver as pessoas que já estão cumprindo pelo ato cometido”. Ela falou sobre o difícil trabalho de reestruturação emocional das mulheres. “As pessoas passam por emoções que podem ser cicatrizadas, mas as marcas ficam para o resto da vida”.

Ana Lúcia disse que vai fazer os seguintes encaminhamentos: “Vamos transformar essa reunião em relatório e transformar as ideias em requerimentos para oportunizar medias, ações e resultados”, disse.

Clique aqui e assista a matéria do TV Câmara do Recife.

Em 10.11.2022.