Audiência pública discute a importância da redução de danos para o SUS

Uma estratégia de saúde pública que busca controlar possíveis consequências adversas do consumo de psicoativos, lícitos ou ilícitos. Essa é a definição da redução de danos, que foi tema de uma audiência pública promovida pela Câmara do Recife na tarde desta quinta-feira (11). No evento, promovido pelos mandatos da vereadora Pretas Juntas (PSOL) e do vereador Ivan Moraes (PSOL), representantes de diversos setores da sociedade discutiram a importância das políticas de redução de danos para o Sistema Único de Saúde (SUS), em alusão ao Mês da Luta Antimanicomial.

Além de Pretas Juntas e Moraes, compôs a mesa da audiência o técnico em saúde mental Luiz Carlos de Almeida, que representou a gerência de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas da Secretaria Executiva de Atenção Básica da Prefeitura na ocasião. Também estiveram presentes o presidente do Conselho Municipal de Políticas sobre Álcool e outras Drogas, José Aluísio da Silva; a representante do Núcleo Estadual da Luta Antimanicomial – Libertando Subjetividades, Evelly Araújo; a representante do controle social da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), Roseane Freitas; o representante da Escola Livre de Redução de Danos, Arturo Escobar; e o representante da Marcha da Maconha no Recife, Danilo Barros.

Ao dar início à audiência, Pretas Juntas repercutiu as tentativas recentes de atacar a estratégia de redução de danos no campo político. “O conservadorismo tem tentado deslegitimar a saúde pública e os direitos garantidos constitucionalmente aos cidadãos do nosso país, sobretudo quando estamos falando sobre uma iniciativa que resulta em importantes impactos no que tange à prevenção ao uso abusivo de drogas e que, de forma ética, visa a garantir os direitos de todas as pessoas”.

Ivan Moraes fez uma análise sobre o debate público acerca da redução de danos e afirmou que, no Recife, há uma situação de falta de transparência sobre os gastos nas políticas de drogas. O parlamentar criticou, ainda, a destinação de recursos públicos para comunidades terapêuticas.

“Quando a gente vai para o orçamento do Recife, nós não encontramos negritada a política de redução de danos. O que a gente encontra é um programa chamado Promoção das Políticas de Prevenção, Tratamento e Reinserção Social aos Usuários de Drogas. É um programa que executa uma média de R$ 1 milhão por ano, embora tenha uma dotação originária que às vezes passa de R$ 3 milhões. Mas, na prática, não sabemos que política está sendo feito”, disse. “Não temos visto a instalação, por exemplo, de equipamentos que tenham essa finalidade e que sejam conduzidos pelo poder público. E infelizmente, paralelamente, temos visto as gestões municipal, estadual e federal gastando dinheiro com comunidade terapêutica, que é justamente o que a ciência diz que não é a melhor forma de cuidar de pessoas que hoje fazem o uso problemático de qualquer substância”.

A integrante do mandato Pretas Juntas, Débora Aguiar, refletiu sobre a adoção de perspectivas voltadas para a punição de usuários de drogas no Recife. Ela lembrou que a política de redução de danos é prevista no próprio Sistema Único de Saúde. “A política de redução de danos não é só norteada por uma perspectiva do cuidado em si, mas também por uma perspectiva ética, de promoção da autonomia e do respeito a diferença. Isso traz para a gente, também, o quanto é necessário a gente entender o que é a integralidade, a equidade e a universalidade que são previstas dentro do SUS. E é sempre bom frisar que a política de redução de danos é uma política pública garantida pelo SUS”.

Após os vereadores, os convidados que estavam na mesa de debate começaram a fazer suas observações. O representante da Escola Livre de Redução de Danos, Arturo Escobar, lembrou que o debate de temas que são tabus, como a importância da redução de danos, já foram mais difíceis dentro da Câmara Municipal do Recife e em outras esferas políticas. Mas, ele acha que o Poder Legislativo ainda precisa fazer um trabalho maior de esclarecimento sobre a questão.  “A redução de danos, hoje, é uma política pública estabelecida no Brasil. E tem se mostrando uma ferramenta ideal para evidenciar os reais os problemas que estão por trás da questão da droga”.

Representando a Marcha da Maconha, Danilo Barros informou que no dia 20 de maio, a marcha realizará a 16ª edição no Recife, e que será concluída com a realização do Festival da Cultura Canábica. “Não dá para falar da Política de Drogas sem falar das pessoas que foram assassinadas pelas políticas proibicionista, e pela cor das pessoas que morreram”. Segundo ele, a política é racista: cerca de 832 mil pessoas foram presas no Brasil por causa do uso de drogas, em 2019, sendo mais de 50 mil só em Pernambuco. E 75% se declararam pretas e pardas.

O movimento Libertando Subjetividades foi representado por Evelly Araújo. Ela afirmou que a sustentação da política de redução de danos é feita a partir de protagonismos dos movimentos sociais, mas que ela precisa ser pensada em debates intersetoriais. Evelly Araújo destacou a importância do Recife na história da luta antiproibicionista e lamentou que muitos equipamentos que foram construídos, ao longo do tempo, com esse objetivo, já estão desmantelados.

Outro movimento convidado, que teve espaço para falar durante a audiência pública, foi o Controle Social da RAPS. Quem se apresentou foi Roseane Freitas. “Temos que estar juntos para crescer e efetivar direitos. É isso que prega a redução de danos, que é uma estratégia nacional de saúde pública. Por isso, não consigo entender porque os políticos não conseguem perceber isso. Os serviços estão desacreditados por esses políticos, mas os profissionais e as profissionais desses serviços não estão desacreditados junto à população”.

O presidente do Conselho Municipal de Políticas sobre Álcool e outras Drogas (Compad), José Aluísio da Silva, afirmou que pretende, à frente do conselho, fortalecer a Política de Redução de Danos. Aluísio Silva parabenizou o mandato das vereadoras Pretas Juntas, que trouxeram o tema para a Câmara Municipal. Ele disse que um dos grandes inimigos dessa políticos são evangélicos pentecostais, que estão agindo sobretudo através de mandatos eletivos. Mas, ele também cobrou que muitos que se dizem “progressistas” não encampam as propostas antiproibicionistas.

O técnico em Saúde Mental, Luiz Carlos de Almeida, falou em nome da Gerência de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas da Secretaria Executiva de Atenção à Básica. “Entendemos que a redução de danos não pode estar apenas nos consultórios de rua, mas que é uma conceção de acolhimento que precisa estar dentro de toda rede de saúde mental. Nossa ideia é ofertar informações sobre redução de danos para a atenção básica e para postos especializados”. Segundo ele, haverá um curso para os profissionais da rede de atenção básica, reforçando a importância da política de redução.

Ainda de acordo com Luiz Carlos de Almeida, muito se fala que a Secretaria de Saúde do Recife mantém convênios com as comunidades terapêuticas, que trabalham com os dependentes químicos, através de ONGs ligas às igrejas. Mas, ele afirmou que os três convênios não são feitos com essa secretaria, mas que eles fazem parte de programas de outra secretaria.

Luiz Carlos de Almeida observou que a Secretaria da Saúde está reforçando as equipes dos CAPs, pois, nos últimos 12 meses já contratou cerca de 120 profissionais. As equipes dos CAPs para a rede infantojuvenil, segundo ele afirmou, também já foi ampliada para aumentar o acolhimento de jovens. “Também estamos requalificando a estrutura física dos CAPs. O primeiro Centro de Convivência será aberto este ano e outro será construído em 2024”. Ele também, respondeu algumas perguntas apresentadas pelos participantes.

Os encaminhamentos da audiência pública foram apresentados pelo vereador Ivan Moraes.  Na verdade, ele apresentou uma pauta do movimento em favor das políticas de redução de danos. Ivan Moraes leu diversas propostas, entre as quais estão: realização de assembleias gerais mensais para escuta e trica para usuários e profissionais das RAPs e rodas de conversa sobre pratica de redução de danos; ênfase nas atividades e ações de prevenção de drogas; viabilizar um modelo de kits de redução de danos, apontados pelos usuários, para ser distribuído pela gestão e pelos equipamentos.

Outros encaminhamentos: produção de pesquisa de população usuária de álcool e outras drogas no Recife; ampliação e adiantamento de contratação de pessoal, o Plano Municipal de Saúde, para as equipe de ruas; realização da formação de profissionais de saúde nas práticas de redução de danos; planejamento de um política de inserção prioritária de pessoal atendido pelos CAPs em outras políticas municipais; indicação do dia 26 de junho como o Dia do Acolha, Mas não Puna.

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Em 11.05.2023.