Os desafios para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) no Recife são debatidos em audiência pública

O programa de Ensino de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino tendo como público alvo as pessoas que não completaram, abandonaram ou não tiveram acesso à educação formal na idade apropriada. E com o objetivo de debater demandas e sugestões ao EJA na capital pernambucana, a vereadora Liana Cirne (PT) promoveu uma audiência pública sobre o tema: “Os Desafios para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) no Recife”. O evento aconteceu na manhã desta quarta-feira (27), no plenarinho, com ampla participação de representantes do poder público, professores e sociedade civil. A parlamentar aproveitou a ocasião para fazer a entrega de um voto de aplausos ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE).

“Nós temos números alarmantes do analfabetismo no Brasil. São 9 milhões e 400 mil pessoas não alfabetizadas. Pessoas que não conseguem ler um contrato, nem ler os seus direitos. A alfabetização é porta de entrada e de acesso à cidadania e ninguém é não alfabetizado porque deseja. Em Pernambuco, a média é de 11% e a média de pessoas idosas não alfabetizadas é de 30%. A cada 10 pessoas idosas em nosso Estado, três não podem ler. Tem que ter metodologia, incentivos e ofertas em turno e contraturno”, disse Liana Cirne.

Por videoconferência, a deputada federal Reginete Bispo (PT/RS) fez questão de enfatizar o momento do debate na Casa de José Mariano, pontuou que participa na Câmara dos Deputados, em Brasília, da Comissão do Idoso e frisou a importância da educação para o público específico. “É uma Comissão que tem pautado temas fundamentais para pensar a política e os direitos da pessoa idosa e nós colocamos o tema da educação porque ele está na centralidade das necessidades. Quando propusemos a educação é porque existe uma grande concentração de idosos analfabetos. Além de constatar que essas pessoas estão ativas, produzindo trabalho e têm o direito de saber como acessar novas tecnologias. Os estados devem formular as políticas públicas para erradicar o analfabetismo nos idosos”.

A professora Cláudia Borges Costa, diretora de Políticas de Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (SECAD), do Ministério da Educação, ressaltou a importância dos movimentos sociais e anunciou que o Ministério está formulando uma Política Nacional com foco na Alfabetização de Jovens e Adultos. “A gente sabe o quanto que os movimentos sociais e a educação popular são importantes para a EJA. O Ministério da Educação está fazendo um desenho da nossa Política Nacional com foco na alfabetização e também analisando a qualificação da educação de jovens e adultos como um todo. Estamos traçando um Pacto Nacional pela Alfabetização e Qualificação da Educação de Jovens e Adultos e convidamos todos para pensar as diretrizes curriculares da EJA, ano que vem. Faremos um movimento em todo o país”.

Cinthia Santos, coordenadora do Fórum EJA de Pernambuco e Nacional, destacou sugestões e demandas que podem contribuir para o EJA. “Recife precisa organizar um percurso de qualificação profissional para os estudantes que hoje fazem parte do sexto ao nono ano da fase 2. Uma outra questão é que nós precisamos ampliar o debate do fórum de EJA Recife a partir da realidade escolar, garantindo uma participação ampla.  Devemos fomentar a diversificação curricular dentro do ensino médio porque a oferta da EJA não é só municipal, é estadual também. É preciso fazer na rede um reordenamento com dados, junto ao censo, pesquisas e arranjos produtivos da realidade da população recifense para que não ocorra o fechamento de turmas onde têm demandas de matrícula e/ou aberturas de turmas e possibilidade de abertura de turmas em horários, não apenas no noturno, conforme está determinada numa lei federal”.     

Sabrina Brito, professora da EJA e diretora da Secretaria de Assuntos Educacionais do Simpere, contou que a entidade vem realizando visitas nas unidades educacionais para dialogar com professores e estudantes. De acordo com ela, há uma expressiva redução de idosos nas unidades de ensino. "Temos tido a entrada de um número expressivo de estudantes de 15, 17 e 18 anos na EJA. É um fenômeno nacional que talvez tenha contribuído para a redução da presença de pessoas idosas, que está alinhada à Política Nacional de Alfabetização, que é o engajamento nacional para sanar esse índice de analfabetismo do Brasil", disse. 

Por sua vez, Isabela Rodrigues, promotora e coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Defesa da Educação do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), fez questão de destacar que a EJA é uma política de estado que precisa ser reforçada. "A importância dessa modalidade é a mesma da educação básica, porque o EJA é para quem não pôde concluir ou iniciar os estudos na idade que a legislação diz. Não dá para atrelar o EJA sempre ao período noturno porque é um público que não tem condições de estar à noite na escola. A importância dessa discussão é porque o índice de pessoas não alfabetizadas do País está numa situação crítica, e Pernambuco conseguiu ficar numa situação um pouco mais crítica que o restante do Brasil. Nesse contexto, o MPPE lançou o EjaJá, demonstrando a importância de ser algo imediato que se tornou um projeto institucional que já está reverberando em todo o Estado", pontuou. 

Já Marília Cibelle, diretora da Secretaria para Assuntos Educacionais no Sintepe, falou sobre o fechamento das turmas de EJA em algumas escolas. "A Escola Trajano Chacon, por exemplo, ampliou as turmas em tempo integral e fechou as turmas de EJA. Isso fez com que os alunos se evadissem do sistema porque tiveram que ir para outras escolas, imagina no campo. O analfabetismo tem cor, raça, gênero e localidade, porque ele está concentrado no campo. Lá, os estudantes precisam sair da zona rural para se deslocar até o centro da cidade para estudar, e tudo isso à noite, mas temos um recorte maior de pessoas idosas, que passam o dia trabalhando na lavoura, e como elas vão pegar um ônibus à noite para estudar no centro?. É crucial e urgente a ampliação do acesso à educação em todas as cidades".

Salomão Abdo, Promotor do Centro de Apoio Operacional de Defesa da Educação do Ministério Público de Pernambuco (CAOP MPPE), recordou que existe a EJA nos presídios e elogiou a iniciativa da Prefeitura do Recife sobre a presença de assistentes sociais e psicólogos nas escolas. “É uma situação que a gente não pode esquecer: a EJA nas unidades prisionais. Nós procuramos, de fato, atender a todos os pleitos e o Ministério Público é um órgão de ouvidoria social, além de investigar e trabalhar naquilo que é possível fazer. Reitero que o movimento popular, sindicatos e fóruns são parceiros e aliados, como também o próprio poder público. Tivemos uma reunião positiva com o município sobre a presença de psicólogo e assistentes sociais nas escolas. É um avanço”.

Heleno Araújo, professor e presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), ressaltou que era preciso efetivar o Plano Nacional de Educação de forma concreta e fez uma sugestão à EJA. “Criar um programa para que as associações de moradores e as escolas possam chegar nessas pessoas em cada bairro da nossa cidade e em cada bairro dos municípios do nosso país”.  

Bruno Oliveira, chefe de Divisão da Educação de Jovens e Adultos na Prefeitura da Cidade do Recife, disse que o desafio atual da EJA é maior e citou números de atendimento à população que cursa a modalidade de ensino. “O desafio hoje não é só pensar na manutenção da EJA, mas como o aluno chega até a gente. É preciso inovar e a gente tem tentado inovar. Em 2017, demos início a um projeto com formação profissional e os estudantes tinham aula aos sábados. Eu me surpreendia com a alta da frequência, mesmo sendo um dia de sábado. Em 2023, nós temos 100 escolas, 225 turmas, 4603 estudantes e a Secretaria tem realizado busca ativa, lançado campanhas e agradeço ao Ministério Público de Pernambuco que está utilizando os seus meios de comunicação para replicar essa busca ativa da gente”.

A vereadora Ana Lúcia (Republicanos) pontuou o desafio da modalidade EJA em juntar estudantes adolescentes e idosos na mesma turma. "Eles têm uma forma diferente de conversar, de socializar. É um choque muito grande de gerações. Mas o que nós precisamos fazer para que essa convivência funcione? Ambos têm muito o que ensinar uns para os outros. É importante que se trabalhe em um planejamento pedagógico específico para levar o conteúdo às salas de aulas, para que elas se tornem atrativas porque o estudante que está ali teve a negação de anos e já chega na sala de aula cansado do dia de trabalho. Estamos trabalhando com idosos e adolescentes que têm o tempo pedagógico diferente. É uma tarefa importante para pensarmos", sugeriu.

Ana Paula Tavares, presidente do Conselho Municipal de Educação, citou os trabalhos desenvolvidos pelo órgão. “Nós temos uma resolução que vem sendo trabalhada envolvendo vários órgãos, como o Ministério Público de Pernambuco. Que a gente possa ampliar cada vez mais essa discussão”.  Já Diego Félix, gerente de Políticas Educacionais de Jovens, Adultos e Idosos do Estado de Pernambuco, falou das ações da pasta, a exemplo da busca ativa nas comunidades. “Nós decidimos construir um currículo de Pernambuco próprio para a EJA. E uma medida recente é relacionada à busca ativa de estudantes e pessoas da comunidade que ainda não ingressaram na sala de aula. A Secretaria de Educação instituiu um programa de monitoria fazendo com que a escola passe a ter o direito a dois monitores. Eles fazem jus a uma bolsa de no valor de R$ 800 reais e atuam nesse trabalho de busca dentro da comunidade. A nossa orientação é de que esse monitor de busca ativa seja um estudante da modalidade ou egresso da modalidade EJA porque  conhece a realidade daquela comunidade”.

Clique aqui e assista a matéria do TV Câmara do Recife.

Em 27.09.2023